Inumeráveis
cajueiros vegetam e frutificam nos campos e florestas dos subúrbios desta
cidade de Santarém. Produzem anualmente copiosos frutos dos quais o povo
escolhe sempre os mais doces para chupar o suco, isto sem utilidade alguma para
a indústria.
Do ano de 1854 a
esta parte, o gênio curioso e altamente empreendedor do sr. Joaquim Honório da
Silva Rebello, conhecendo que, do sumo desta fruta, algum proveito de maior
interesse poderia tirar-se, deu-se ao improbo trabalho de examinar suas
qualidades naturais em ordem a reconhecer qual o melhor uso que a indústria
poderia fazer dele em utilidade comum. Depois de repetidos ensaios e acuradas
experiências conseguiu, enfim, obter um delicioso vinho, preparado por um
processo inteiramente de sua invenção, e bem assim outras muitas bebidas.
Na sazão
própria, que anualmente coincide com o outono, o sr. Rebello, acompanhado com
algumas pessoas do seu serviço, dirige-se ao campo a fim de colher esses
frutos, e apenas lhe cabem os mais azedos, refugos abandonados pelo povo que,
como acima se disse, se aproveita com avidez dos mais doces. Da mesma qualidade
são os que, em paneiros, costuma comprar, e todos não chegam a fazer a 3ª parte
dos frutos, produzidos em cada sazão, devido isto a falta de meios, que não o
habilitam para maiores despesas. Tem fabricado todos os anos cerca de 4 pipas,
e se lhe fosse possível fazer a colheita em maior escala poderia fabricar, por
um termo médio, para mais de 12 pipas anualmente.
Começando a sua
empresa em pequeno, tem com o andar do tempo progredido, em proporção de suas
forças, exportando em maior quantidade, nos três últimos anos precedentes, nos
quais o fabrico se tem elevado a maior perfeição e pureza de modo, que se lhe
pode dar, sem exageração, o título de genuíno vinho de caju, correndo parelhas
com os mais excelentes vinhos da Europa.
Tem igualmente
fabricado, do mesmo suco do caju, o vinho abafado, o champanhezado, o composto
com salsa, a aguardente, o licor dulcificado, o vinagre, o capilé e mesmo a
geleia.
Suas
experiências se tem do mesmo modo exercido sobre o suco de outras diversas
frutas, a cana de açúcar há também sofrido seus ensaios, em ordem a obter de
sua calda um vinho igual ao de caju, e os resultados tem coroado seus esforços
posto que, acanhados ainda, pela mesma razão da exiguidade de meios à sua
disposição.
O sr. Rebello,
com quanto destituído dos preliminares precisos para entrar no santuário da
química, todavia seu gosto e tendência natural por este importante ramo dos
conhecimentos humanos o tem levado a estuda-la, mediante as sábias explicações
dos seus dedicados amigos, o ilustrado sr. Affonso Maugin Dezincout e o
habilíssimo farmacêutico, o sr. João Batista de Mattos, que com seus
esclarecimentos muito o tem ajudado, e a quem ele se confessa sumamente grato.
Concluímos,
pois, repetindo que o sr. Rebello, baldo de recursos, apenas possuí o amor ao
trabalho, e uma dedicação a toda prova: eis os elementos com que tem adquirido
um crédito sem limites, e é estes em contradição o único capital com que há
lucrado os meios de uma subsistência honesta. Necessita, portanto, de mais
valiosos incentivos, que o animem a progredir com vantagem, neste ramo de sua
invenção, de tanta consequência para a indústria do país, e que no futuro
promete ser um dos gêneros mais preciosos do nosso comércio de exportação.
Quando se trata
de criar novas indústrias e de lhes dar o devido impulso, a solicitude do
Governo é, sem dúvida, a primeira condição de tais melhoramentos, pois, sem
esta garantia e animação, perdidos serão os mais bem combinados planos da parte
dos empreendedores.
Santarém, 28 de
junho de 1859.
Assina: O Amante
dos melhoramentos úteis.
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