Indagando-se
sorrateiramente de algumas pessoas que voltaram da Fordlândia, contrariados com
os últimos acontecimentos dali, sabe-se que a estupidez foi a causa motriz de
tudo.
Entre a gente
que ali se encontra, há homens que, embora humildes e sem trato algum que os
recomende, são, por índole, sensatos e cumpridores dos seus deveres; e há a
escória. Esta classe nunca é composta de caboclos dos sítios e nem de matutos
sertanejos, e sim de marinheiros e soldados insubordinados, desertores,
empregados infiéis de reputação reconhecida, agentes de jogos e
contrabandistas, capangas profissionais, foragidos das casas de correção e dos
seus próprios lares, e outros inimigos da sociedade.
E todos têm cara
de gente.
Por isso, era de
prever-se, mais cedo ou mais tarde, qualquer anormalidade.
Bastava para
isso um pretexto.
Naquele dia (da
Revolta do “Quebra Panelas”), um trabalhador chama um dos chefes estrangeiros e
reclama a inconveniência de uma inovação não maneira de serem servidos no
refeitório, a que não estavam habituados, e o chefe, ignorando o peso de sua
resposta, atira: “Para brasileiro está bom! ”
Foi o bastante!
(Os poucos de
boa índole, aquietaram), mas a escória, em número muito superior, irrita-se,
avança, invade, depreda, ameaça e arrasta pela força os outros que, apesar de
tudo, sentiam-se satisfeitos naquela tenda de trabalho, onde tinham como certo
o seu ganha-pão.
Mais não
fizeram, impedidos pelos rogos de outros trabalhadores, do Dr. Siqueira Mendes
e do engenheiro Chatfield, a quem eles têm uma espécie de veneração.
Tudo isso por
que?
Porque a maior
parte dos auxiliares nacionais, dos administradores da Companhia, não tem uma
digna compostura para exercer os seus cargos. Em vez de procurarem implantar a
cordialidade entre a gerência e os trabalhadores, cavam abismos servindo-se de
intrigas e pirraças, e outros meios de detrimentos para a própria Companhia.
Ou a
administração da Empresa Ford é muito ingênua, ou muito vaidosa, senão há muito
tempo ter-se-ia prevenido, tomando as necessárias providências.
E agora, o que
sucede?
É que o sr.
Henry Ford, que nunca deu motivos para desgostar os seus trabalhadores, está
sendo prejudicado, e os nossos pobres patrícios, arrancados da sua tábua de
salvação e atirados às incertezas do presente momento, quando até os
privilegiados da sorte estão em expectativa.
Não será uma
vindicta esta decisão tão brusca dos administradores da Companhia contra os
nossos interesses nacionais?
Este êxodo
parece mais um acinte do que uma medida de ordem.
Faz-nos lembrar
a emigração dos famintos dos sertões nordestinos e os tempos de seca, com a
diferença apenas que lá emigram em procura do trabalho e ali os expulsam dele;
os de lá emigram, viajando entre a terra seca e o céu azul, e os dali,
simplesmente enjaulados.
Em face da
situação que atravessamos, tais atos parecem insensatos.
Por que não
procuram os responsáveis dos crimes?
Por que os
inocentes também são castigados?
É a eterna “questão
de caprichos” de quem pode...
Zé Brasileiro
NOTA: Publicado
no Jornal A Justiça de 10 de janeiro de 1931.
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