quinta-feira, 23 de março de 2023

Documentos da Cabanagem: Ofício sobre a tomada de Santarém pelos cabanos em 1834.

 

Abaixo publicamos um dos documentos reproduzidos na obra: “Pequena cronologia da Cabanagem no Baixo Amazonas e Tapajós” (2019). Este ofício fala da tomada de Santarém (então denominada Vila de Tapajós), por cerca de 300 cabanos que invadiram a vila exigindo a expulsão de todos os portugueses que moravam em Santarém naquele tempo. Alguns chegaram a ser expulsos, conforme documento (Lista nominal) também já publicado neste blog. Na imagem: “O cabano” em concepção e pintura do artista santareno Elias Lopes do Rosário.

 


Ilmo. e Exmo. Sr.

Cumpre-me levar ao conhecimento de V. Exa. a narrativa dos sucessos inesperados, que tiveram lugar nesta Vila ao amanhecer do dia três do corrente, quando tranquilos saboreávamos os frutos de uma paz serena. Pelas cinco horas da manhã ao toque da alvorada, se ouviu romper o de um rebate, que facilmente se soube ser no lugar do depósito do armamento, e munições de guerra, que assaltado inopinadamente por uma porção de gente, e se achava entregue a trezentos homens, pouco mais ou menos, que compunham aquela reunião; compareceu imediatamente o Juiz de Paz do primeiro Distrito, acompanhado das demais Autoridades Territoriais, e coadjuvados do Reverendo Vigário Geral lhes dirigiu a pergunta de qual era a causa daquele ajuntamento por todos os títulos ilegal e criminoso, tomou-se-lhe em resposta, que haviam rompido naquele excesso por denúncias de que os portugueses e adotivos, dispunham uma agressão contra Brasileiros natos; e que o objeto de sua requisição era a deportação dos referidos; foi preciso recorrer aos ditames da prudência (atenta a crise melindrosa) contemporizando quanto as circunstâncias exigiam, até que calmasse o calor sedicioso, dando imediatas providências para o cumprimento da requisição; pois que o contrário se tornava perigoso, e uma aluvião de males submergiria a bela Vila de Tapajós: três dias sucessivos se conservaram na mesma atitude, e antevendo que talvez não fossem constantes em manter-se por mais tempo no círculo da moderação, lancei mão do único remédio que a prudência e a política podiam sugerir, qual o da convocação de um Conselho composto de todas as autoridades e cidadãos Grados, com o fim de evitar-se as animosidades e desatinos que costumam a acompanhar as perturbações públicas; do conteúdo da Ata, que envio por cópia a V. Exa. verá as deliberações do mencionado Conselho, e a maneira porque salvou o Município, fazendo o sacrifício de transigir com os sediciosos, resultando-lhe desta arte a vantagem de restabelecer o sossego público, e tranquilidade das famílias, e restituindo a paz e a ordem aos nossos lares.

Longe de pretender disfarçar o crime, que perpetraram os revoltados, cumpre-me afirmar a V. Exa., em obséquio à verdade mais pura, que desde o começo da sua reunião até o desvanecimento dela guardaram a melhor ordem, e se conservam nos limites de uma moderação superior a todo elogio. Fica o Município em perfeito sossego até o momento. É o quanto se me oferece participar a V. Exa. em desempenho dos meus deveres.

Deus Guarde a V. Exa. muitos anos. Tapajós, 7 de agosto de 1834.

(Ao) Ilmo. e Exmo. Sr. Bernardo de Souza Lobo, Deputado à Assembleia Geral Legislativa e Presidente desta Província.

(Assina) Agostinho Pedro Auzier, Juiz Municipal, e de Direito Interino.

Está conforme.

José Antônio da Fonseca Lessa, Secretário do Governo.

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