terça-feira, 24 de novembro de 2015

Artigo: A Primeira Festa de Nossa Senhora da Conceição

Pe. Sidney Augusto Canto

Corria o ano de 1661. O padre Antônio Vieira, preocupado com a vastidão da Amazônia e a ausência de padres na região acima do rio Xingu, decide fundar uma missão entre os índios que viviam na foz do rio Tapajós. Para isso chama um dos padres recém chegados do reino e o envia, juntamente com um irmão leigo, para esta empreitada.




Foi assim que a 22 de junho chegava ao Tapajós, o Padre João Felipe Bettendorff, acompanhado do irmão leigo Sebastião Teixeira. Não demorou muito tempo, teve o missionário que se ausentar da Aldeia. O motivo, que o mesmo Bettendorff relata em sua “Crônica” foi a constante “melancolia” em que vivia seu companheiro. Na verdade, Sebastião Teixeira havia se encantado com uma das bonitas índias tapajoaras, da família de Maria Moaçara... O amor foi tanto, que mais tarde o mesmo deixou os jesuítas e se amigou com a dita cunhantã.

Bettendorff voltou outra vez, desta feita, acompanhado do Alferes João Correa, conhecedor da língua e dos costumes dos Tapajós. Aqui chegando fez logo uns catecismos na língua dos Tapajós e na dos Urucucus (pois não havia somente os índios tapajós na missão) e batizou muita gente.

Com a ajuda do alferes e dos índios, o Fundador de Santarém construiu a Igreja da Missão e dedicou-a a Nossa Senhora da Conceição. Sobre isso assim relata o seu construtor:

"tratei de fazer a igreja e casas em taipa de mão, indo eu mesmo acompanhar os índios que iam cortar a madeira e padecendo muito boas fomes, no entanto, por estar ainda novato; posta a madeira em a aldeia, a lavrou o companheiro João Corrêa com os índios, e como acudia muita gente assim de índios, como de índias, dentro de três para quatro dias ficou toda a obra feita e coberta. Fiz então um retábulo de morutim, pintando ao meio Nossa Senhora da Conceição pisando em um globo a cabeça de serpente, enroscada ao redor dele, com Santo Inácio à banda direita e S. Francisco Xavier à esquerda".

Era desejo do padre Antonio Vieira, que esta igreja fosse construída em cima do “outeiro” (o morro onde posteriormente foi construída a Fortaleza e hoje se acha a Escola Frei Ambrósio). Bettendorff, porém, construiu-a mais perto de onde moravam os índios, no local onde hoje está a Praça Rodrigues dos Santos. Esta igreja não era muito diferente da casa em que os índios moravam. Era uma capelinha pobre, mas bem limpa e asseada, com um pequeno altar para as celebrações. Foi nesta capelinha, que os moradores da foz do “rio azul” celebraram a sua PRIMEIRA Festa de Nossa Senhora da Conceição.

Passo agora a transcrever um fato narrado pelo próprio Bettendorff, relativo à primeira FESTA DA CONCEIÇÃO ocorrida em terras Santarenas:

À noite antecedente da festa em que se havia por o altar, houve uns trovões, relâmpagos e coriscos, tão terríveis que todos os índios saíram para fora das casas, e parecia que se ia acabando o mundo. Disseram-me depois que tinham visto em o Céu uma mão com um lenço branco que ia limpando o sangue derramado pelo Céu; em o dia seguinte lhes fiz uma prática sobre a Conceição da Imaculada Virgem Senhora Nossa, e disse que este sinal foi alguma coisa, foi prognóstico de um grande castigo que a Senhora havia de remediar”.

Bettendorff, escrevendo a “Crônica” posteriormente, atribuiu a visão dos índios à perseguição sofrida pelos Jesuítas no ano seguinte, onde muitos padres foram deportados para o Reino, incluindo entre eles o próprio Antonio Vieira.


Foi assim, a partir da devoção do Jesuíta Bettendorff por Nossa Senhora, que Santarém tem hoje a festa de sua padroeira. Talvez o mesmo não imaginasse que Nossa Senhora da Conceição recebesse as homenagens que lhe são prestadas pelos milhares de descentes daqueles índios de outrora. E, apesar de tantos males que ainda nos afligem, pedimos que Jesus Cristo, filho de Maria, nossa padroeira, nos livre dos males que ainda hoje tentam ofuscar a beleza da terra, da nossa história e da cultura do povo Santareno. 

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