O
Documento abaixo transcrito, feito pelo Governo do Estado de Mato Grosso, foi
uma das primeiras tentativas, na época da República, de abrir a estrada que,
desde o Império, vinha sendo concebida para ligar as cidades de Cuiabá até
Santarém:
“DECRETO Nº 38
O
General de Divisão Antônio Maria Coelho, Grã-Cruz da Ordem de S. Bento de Aviz,
Governador do Estado de Mato Grosso.
Considerando
que é de urgente necessidade, hoje por todos reconhecida e proclamada, o
estabelecimento de uma comunicação direta e regular com o Estado do Pará, por
uma estrada em condições de assegurar o trânsito contínuo e permanente entre
esta capital e a cidade de Itaituba, quando não à Santarém, abrindo assim à
nossa indústria pastoril tão carecedora de amparo, o seu melhor mercado no
futuro, o que só por si justificaria quaisquer sacrifícios razoáveis à que para
tal objetivo fossemos obrigados;
Considerando
estar Mato Grosso em condições de exportar atualmente um mínimo de 50.000
cabeças de gado anualmente e que destas nunca menos de 10.000 transitarão desde
logo pela aludida estrada;
Considerando
que as terras a serem por ela atravessadas são de uma fertilidade e riqueza prodigiosas
– e já muito conhecidas – tão aproveitáveis para a lavoura e a criação, como
para as indústrias extrativistas vegetais e animais, de modo assegurar, além do
pronto povoamento de suas margens, vantagens imensas às empresas que com tal
intento se organizarem;
Decreta:
Art.
1º. É declarada aberta a concorrência para a construção de uma estrada de
rodagem desta capital à cidade de Itaituba ou à de Santarém, no Estado do Pará,
obtida do governo desse Estado a necessária concessão para a parte no mesmo
compreendida.
§
único. O prazo desta concorrência será de seis meses a datar deste decreto, e
findo ele, senão houver sido efetuado o contrato respectivo, o governo deste
Estado de combinação e acordo com o do Pará, poderá mandar proceder aos
trabalhos da construção da estrada administrativamente, feita as operações de
crédito que julgar necessárias.
Art.
2º. A empresa, ou indivíduo ou companhia, que efetuar a construção da estrada
nas condições gerais aqui fixadas, serão concedidas, dentro da competência do
governo deste Estado, as vantagens seguintes:
1ª.
A percepção privilegiada durante o prazo máximo de 30 anos, de um imposto de
trânsito, que será decretado em seu benefício, sobre o gado vacum, cavalar ou
muar que transite na aludida estrada com destino deste Estado ao do Pará, e
vice-versa. Imposto que não excederá de 3$000 por animal em tropa exportado ou
importado e 1$000 por animal carregado (cargueiro). Para a percepção deste
imposto estabelecerá a empresa as barreiras ou agências ficais que entender e
gozará de todas as vantagens e regalias da fazenda do Estado, segundo as leis
em vigor.
2ª.
A garantia de outra concessão de estrada, nas condições da deste decreto, não
será feita com a mesma direção, dentro de trinta quilômetros a cada uma das
margens da que for por ela construída.
3ª.
Preferência para a construção, dentro da zona da concessão, de estrada de
ferro, ou mista, com a mesma direção.
4ª.
Preferência para a exploração e extração na referida zona de produtos vegetais
e minerais, a aquisição de terras, estabelecimentos de núcleos coloniais
agrícolas ou pastoris, e quaisquer outras concessões idênticas.
5ª.
Finalmente, garantia dos juros de 7% sobre o capital efetivamente empregado na
construção da estrada durante o prazo do privilégio.
Art.
4º. Com relação à estrada, serão guardadas as seguintes condições essenciais:
1ª.
Terá a largura nunca inferior a 5 metros em matas como em campos e obedecerá o
mais possível a direção da reta entre os dois pontos terminais, Cuiabá e
Itaituba ou Santarém, dela afastando-se tão só quando imprescindivelmente para
garantia do trânsito – ininterruptamente – nas duas estações, da seca e das
águas.
2ª.
Em todo o percurso da estrada – e com a largura indicada – serão feitas, além
da roçada e do destocamento do terreno, todos os trabalhos de movimento de
terras (escavações, aterros, cortes, taludamento destes, etc...) e outras obras
de arte (pontes, pontilhões, bueiros, drenos, muralhas, calçamentos, estivados,
etc...) que forem julgados necessários para o preparo do leito da estrada de
modo a garantir as condições de perfeita viabilidade da mesma em qualquer tempo
– e sua segurança.
3ª.
Nos cursos d’água (córregos, riachos, sangradouros) de largura inferior a 10
metros serão construídas pontes e pontilhões de solidez garantida, feitas as
obras de arte necessárias à segurança e durabilidade dos mesmos.
4.ª
Nos cursos d’água de largura superior a 10 metros, quando a empresa não
preferir a construção de ponte, serão feitos no atravessadouro ou porto de
passagem os movimentos de terra e obras de arte necessárias a facilitar o
trânsito.
Neste
caso manterá a empresa no porto de passagem canoas ou balsas, ou outras
quaisquer embarcações seguras, que auxiliem o atravessamento do rio, caso
preciso, construídos nas duas margens mangueiros para o encaminhamento e
descida ou subida do gado.
Nos
grandes rios, além dos mangueiros haverá currais, e tanto neste como no caso
acima, as canoas ou balsas terão as proporções necessárias para o transporte
seguro dos passageiros e cargas, podendo a empresa quando se incumba deste
serviço, cobrar por ele uma taxa razoável e previamente fixada, de acordo com o
governo deste Estado.
5ª.
Serão construídas em todo o percurso da estrada, em situações apropriadas e à
distancias não excedendo de 30 léguas, invernadas para o gado em transito, com
currais e arranchamentos suficientes e seguros.
Art.
5º. A empresa será obrigada a conservar em bom estado de segurança a estrada e
suas dependências durante todo o prazo do privilégio, fazendo para esse fim os
trabalhos de reparação e mais obras de arte precisas.
Findo
esse prazo, a estrada – com todas as referidas dependências – será entregue aos
governos dos dois Estados em perfeito estado de conservação e segurança, a
juízo dos árbitros então nomeados para julga-la.
Art.
6º. Os trabalhos de construção da estrada, propriamente ditos só serão
começados após a apresentação e aceitação da planta e dos planos da mesma, e
determinada dentro do prazo que for estipulado entre as partes contratantes e
que não excedera de 3 anos, sendo começada – no máximo – um ano depois do
contrato.
§
1º. Nestes planos, as obras de arte a que se refere este decreto para preparo e
conservação do leito da estrada e segurança das pontes e pontilhões, portos,
atravessadouros de rios, etc., serão perfeita e claramente fixadas e
descriminadas de modo a evitar quaisquer dúvidas futuras. Em todo caso, a
empresa será sempre obrigada as que o engenheiro do Estado entender
necessárias, para segurança e conservação da estrada, salvo resolução superior
do governo – e decidindo árbitros afinal, em caso de dúvidas.
§
2º. A estrada só poderá ser considerada aberta ao trânsito público, para os
efeitos deste decreto, depois de concluída, devendo a declaração oficial de
livre transito preceder o seu exame por engenheiro nomeado pelo Governo, que em
qualquer outra ocasião e estado dos trabalhos poderá mandar fiscalizá-los como
entender melhor.
§
3º. O excesso do prazo pra a iniciação ou terminação dos trabalhos de
construção, sujeitará a empresa a multas cujo quantum e condições serão fixados
pelo governo por ocasião de contrato.
Art.
7º. Serão sempre resolvidas por árbitros, segundo as regras gerais adotadas, as
questões resultantes da interpretação do contrato que for lavrado e outras dele
derivadas, ficando, entretanto, reservado ao Governo o direito de o rescindir,
indenizada a empresa das despesas efetuadas e prejuízos provenientes da
rescisão.
Art.
8º. O governo poderá, se entender conveniente, resgatar a estrada e
dependências durante o prazo da concessão, indenizando a empresa do justo valor
das mesmas, mediante arbitramento.
Art.
9º. Fica salva a necessidade da inclusão no contrato que se lavrar em virtude
deste decreto de clausulas nele não consignadas, já para garantia das partes
contratantes, já para melhor descriminação, aperfeiçoamento e segurança da
estrada e satisfação das necessidades do trânsito.
Art.
10º. São revogadas as disposições em contrário.
Palácio
do Governo do Estado de Mato Grosso, em Cuiabá, 8 de novembro de 1890.
ANTÔNIO
MARIA COELHO”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário