terça-feira, 17 de outubro de 2017

ARTIGO: Cartografia sobre Santarém... Antes de Santarém...

 Por Pe. Sidney Augusto Canto

Esqueça o que aprendemos na Escola. Muitas coisas que nossos professores nos ensinaram sobre nossa história está mudando. Novas descobertas documentais e arqueológicas tem revelado uma nova luz, uma nova visão sobre o passado das muitas “Amazônias” que existem ou já existiram...
Em minha última viagem ao Rio de Janeiro me entretive com muitas pesquisas, fosse no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro ou na Biblioteca Nacional. Entre diversos documentos que me chamaram atenção, estavam os mapas que foram desenhados nos anos de 1500. Muitos deles mostrando a Amazônia.


Um desses mapas, desenhado apenas 20 anos depois da passagem de Francisco de Orellana, pelo cartógrafo da Casa de la Contratación de Sevilho, o espanhol Diego Gutierrez, mostra o “Rio de Topaios”. É um documento de 1562 que já menciona o rio que hoje banha o município de Santarém, desaguando no rio Amazonas, em frente à sede da cidade (um trecho desse mapa foi publicado no terceiro volume do meu livro “Santarém: histórias e curiosidades, 2016).
Como se pode ver, Pedro Teixeira ainda nem era nascido quando o “Rio de Topaios” já era conhecido pelos Espanhóis. Ou seja, a atribuição de que Pedro Teixeira “descobriu” o rio Tapajós, mais de 80 anos depois dos espanhóis é questionável. Aliás, antes de Pedro Teixeira, não somente os espanhóis estiveram na foz do rio Tapajós. Franceses, ingleses e, principalmente holandeses, mantinham comércio e relações com os indígenas que habitavam o lugar que hoje conhecemos por Santarém (aqui mesmo, no blog, já postamos descrições feitas por espanhóis e holandeses sobre os indígenas da foz do rio Tapajós).
No entanto, um fato pouco estudado nos diversos mapas da época é a menção de uma CIDADE na foz do já citado rio, que os nativos chamavam de “PARANÁ-PIXUNA” (ou Rio Preto). Uma cidade sim, visto que, em muitos mapas daquela época, o desenho de legenda de cidades aplicado a Cuzco ou Quito é também colocado na foz do rio dos Tapajós.
Para ilustrar cito três mapas. O primeiro do cartógrafo Abraham Ortelius, de 1570, que trabalhou para os ingleses, mas que no citado ano teve seu “Atlas” impresso pelos holandeses, e que é o mais antigo mapa conhecido até hoje (pois amanhã pode ser que encontremos um mais antigo ainda), a mencionar uma cidade com o nome de HUMOS, situada na foz do “Rio de los Topajos” (termo esse, comumente usado pelos holandeses em seus mapas).
Em 1585, o cartógrafo holandês Johannes van Doetechum novamente coloca uma CIDADE, com o nome de HUMOS, na foz do rio “Rio de los Topajos” (um trecho desse mapa também está publicado no terceiro volume do meu livro “Santarém: história e curiosidades”, em 2016).
Outro cartógrafo holandês, Jan Huygen van Linschoten, em 1596 publicava um mapa onde novamente a cidade de HUMOS aparece na foz do “Rio de los Topajos”. Esse mapa, que parcialmente vem ilustrando este artigo (veja acima) tem uma outra curiosidade. Além da cidade de Humos estar legendada (igual a Cuzco e Quito), o Rio Tapajós aparece como servindo de divisão entre as terras portuguesas (BRASILIA) e espanholas (PERVVIANA), muito anos antes da famosa viagem de Pedro Teixeira a Quito.
Outros mapas existem ainda para serem estudados. Na época, os mapas eram uma preciosidade de proteção Real. Hoje, sendo redescobertos em diversas bibliotecas e arquivos da Europa, trazem novas luzes para nossa história. Porque Humos? Isso ainda carece de pesquisa. No entanto, o fato de existir uma cidade na foz do antigo “Rio Preto”, antes da chegada dos europeus, isso não deveria causar espanto.
É fato comprovado, já há muitos anos, a existência de uma cidade, na foz do rio Tapajós, antes da chegada dos portugueses, e que a mesma já era conhecida por outros povos. Daí que a afirmação do companheiro de Pedro Teixeira, Mauricio de Heriarte, que relatou os povos da foz do rio Tapajós como uma sociedade composta de 60 mil homens armados de arcos e flechas, sem contar mulheres e crianças, não ser assim tão inverossímil, pois as descobertas arqueológicas recentes vem constatar a ocupação da foz do rio como sendo um dos lugares mais antigos da Amazônia em ocupação permanente.
É certo que, para alguns, isso causa espanto, mas não se pode negar o fato de que, antes da chegada dos portugueses, o lugar que hoje conhecemos como Santarém era uma sociedade organizada, viva e atuante na região. Possuía destacada importância no comércio, na guerra, na agricultura e nas artes. A cartografia, assim como outros documentos históricos que estão vindo à tona nos últimos anos, tem nos ajudado a entender como era a vida da cidade “do Tapajós”, antes de ser a Santarém que conhecemos hoje.


2 comentários:

  1. Excelente matéria.
    Parabéns com o cuidado em extrair das fontes históricas a verdadeira história de nossa região...Porém, ao examinar o mapa pareceu-me que é o rio Paraná quem divide as terras Brasilia e Pervviana e nao o Tapajós.
    Um abraço e parabens pela matéria!

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  2. Paranã Pixuna: Paranã: 'Grande rio, grande com o mar. A palavra Pará 'significa MAR', ou seja, Grande Rio Preto.

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