sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Documentos Históricos: Carta de um imigrante norte-americano - 1868

O texto a seguir foi escrito em agosto de 1868. É uma carta feita por um dos imigrantes norte-americanos que vieram para Santarém, após a Guerra Civil Norte Americana. A vida e a situação de algumas das famílias, que adotaram esta terra como sendo sua, são tratadas na missiva. A colônia vivia tempos de adaptação aos trópicos. O jovem escritor propagandeia aos seus compatriotas (a carta foi escrita originalmente em inglês e traduzida para o português por jornais da capital) que Santarém prometia um futuro brilhante para quem estivesse disposto a trabalhar, rebatendo a ideia de que as coisas estavam em estado deplorável. É um raro e bonito documento do início da colônia norte-americana em Santarém. Boa leitura!


Caro Senhor.
Tomo a liberdade de escrever-vos, convencido de que vosso jornal inclina-se, o que é um ato de caridade, a ajudar a nós infelizes sulistas a darmos publicidade aos apelos que fazemos aos irmãos exilados. Supondo também que haveis de estimar ter notícias nossas, distantes como estamos nas margens do Amazonas, quase fora do quadro da civilização, sepultados nas longínquas regiões do Amazonas.
Os meios de comunicação com o Rio de Janeiro e outros portos do Brasil ao Sul do Rio, são tão escassos e incertos que poucas vezes procuramos dar aos nossos concidadãos do Sul notícias a nosso respeito.
Além disso, as notícias dessa parte do Brasil são-nos tão desfavoráveis, que julgamos felizes comunicar-vos o quanto temos prosperado: não tem sido em grande escala, é verdade, mas é suficiente e estamos contentes. Temos caminhado devagar, com custo nos mantemos; mas não temos tido tempo para mais. Nós mesmos tivemos que trabalhar, pois nenhum de nós tinha dinheiro preciso para alugar gente.
Como é natural, não se podia esperar que homens não acostumados ao pesado trabalho corporal pudessem, em poucos meses, preparar grandes plantações; tem-se feito o que estava nas nossas forças.
Alguns vivem hoje tão comodamente como viviam nos Estados Unidos antes da guerra. O dr. Pitts, do Tenessee, por exemplo, tem uma excelente mesa e só compra carne seca.
No domingo passado visitei-o. Estava bom e alegre, mas sua senhora não estava de todo satisfeita, porque, segundo ela me disse, faziam sete semanas que ela não via uma senhora americana.
O dr. tem batatas doces, grande variedade de feijão e ervilhas, aboboras, milho verde, pepinos, e apresentou-me um prato ao jantar de que gostei muito. Tem também abundância de tomates e melancias. O seu jardim não é uma exceção, outros tem melhores.
O sr. Rhome no engenho Taperinha tem sempre biscoitos, manteiga fresca e leite, e todas as frutas dos trópicos para sobremesa.
Os srs. Vaughan, Riker e Weatherly, estão também prosperando, suas plantações florescem e prometem muito. O sr. Vaughan tem grande plantação de fumo e está preparando o que já colheu para vender.
Apesar da bulha que tem feito os colonos do major Hasting, por quase todos os vapores, saudamos a chegada de novos amigos que vem para nossa colônia.
Não há muito tempo que aqui chegaram o revdo. R. T. Hennington, o sr. B. Spurlock e o dr. S. F. Stroope, cada um com sua família, acompanhados dos srs. P. Norman e John P. Massey.
O sr. Hennington é do Mississipi, o sr. Spurlock do Texas, o dr. Stroope do Arkansas, e os dois jovens do Mississipi.
O sr. Hennington comprou o estabelecimento do sr. Sparks, e fez ali sua residência.
O dr. Stroope estabeleceu-se também dentro dos limites da colônia.
O juiz S. B Mendenhall, do Alabama, com sua família são vizinhos do sr. Hennington e estão muito satisfeitos. O juiz tem muita esperança na sua plantação de fumo, e creio que tem razão para isso. Um filhinho dele levou à cidade há dias um carro carregado de hortaliça e vendeu toda aos vapores.
O sr. E. S. Wallase foi à cidade no sábado passado, com uma grande canoa carregada de milho para vender, e contratou ainda a venda de 2.000 mãos do mesmo produto, que ainda lhe restavam da safra do ano passado. Vendeu tudo, creio que a 320 réis a mão de 50 espigas.
O algodão americano produz bem aqui, mas nenhum de nós tem os meios necessários para entrar em grande escala no seu cultivo.
Se algum capitalista viesse para aqui, havia de ganhar dinheiro no cultivo do algodão. O fumo desenvolve-se nestas regiões espantosamente, e neste mesmo ano, já nos vai dar bom resultado.
O general Dobbins, o coronel Menefee, o dr. Jones e família, o dr. Carter e família, e o coronel Charles M. Broome, estão bem estabelecidos em Tapajós, a dois ou três dias de viagem de Santarém.
O dr. Carter disse-me que tinha uma árvore de algodão da América com 250 frutas. Este algodão conserva a mesma altura que nos Estados Unidos, mas desenvolve-se com mais esplendor do que lá. Estes senhores estão confortavelmente estabelecidos, e creio que resolvidos a ficarem.
O sr. P. O. Chaffier tem, segundo dizem, 15.000 plantas de fumo, das quais ele mesmo trata, e que prometem dar-lhe um belo resultado.
Meu pai, o capitão S. L. Mc. Gee comprou uma fazenda de açúcar perto da cidade do Pará.
Visitei-o há pouco tempo e encontrei-o muito ocupado a destilar cachaça. Minha mãe e irmã estavam muito satisfeitas e nada seria capaz hoje de induzi-las a voltar à mãe pátria.
Na cidade residem alguns americanos.
O revdo. Sr. Harvey tem aqui uma escola e ensina inglês. É frequentada por 30 a 40 rapazes e vai em progresso.
Estamos esperando muitas pessoas dos Estados Unidos. Deve chegar a todo momento o capitão Matheus de Mobile e muitos outros. A nossa colônia, desejamos que fique bem entendido, não está decaída. Ao contrário, baqueou para levantar-se ainda mais florescente. Assim o julgamos.
Estamos aqui, mas não em deploráveis circunstâncias; folgaremos em saudar a chegada dos nossos irmãos de infortúnio que quiserem visitar as nossas praias.
Até outra vez e sou com respeito.

Jos. L. Mc. Gee”.

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