quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Balaio da Saudade: Um conto alenquerense


Por Symaco da Costa

Em Alenquer, uma cidadezinha perdida no interior do Estado do Pará, um dos seus antigos Intendentes era alto comerciante. Sua casa vendia de tudo, vendia até MACUMBA, já preparada. Se o cara queria casar-se com alguém que o detestava, já sabia, procurava a “Estrela”, nome do estabelecimento do chefe do município. Se, ao contrário, desejava livrar-se da mulher, recorria também à “Estrela”, onde comprava o seu “despacho”, já preparadinho da silva...
O dono do empório, vamos chama-lo de Silvino, tinha uma filha, a Lourdes, muito bonita, e um caixeiro muito burro, o Benedito Fabiano das Rosas que, aliás, cheirava mal, pois, dificilmente tomava banho. Quando o tomava, todo mundo sabia...

Como em toda parte há sempre um gajo esperto alegre... não seria, portanto, Alenquer que deixaria de tê-lo. Antônio Humberto Batista de Carvalho, o Carvalhinho das meninas, descobriu que o Rosas não era apenas burro: era burríssimo... Então começou a fazer bilhetes em nome da garota do sr. Silvino, o dono da “Estrela”, dizendo-se apaixonada pelo mocinho, e entregava-os pessoalmente ao Rosas. Nos tais escritos, porém, havia sempre os pedidos de latas de goiabada, biscoitos, chocolates, perfumes, o diabo a quatro... E o empregado, mais alegre do que passarinho em manhãs de sol, atendia os falsos reclamos. O Carvalhinho e demais companheiros devoravam tudo... Era uma farra... Riam-se a não poder mais!
Um dia, precisando de uma sineta, para colocar num ginete manhoso que se escondia no mato para não trabalhar, o Carvalhinho escreveu mais algumas linhas. E mais uma vez foi atendido, gostosamente. Oito dias depois, a Lourdes completou vinte anos. Festa em casa do coronel Silvino. À noite, banda de música, toda gente compareceu, até o sr. Vigário que, dada a sua avançada idade, pouco saía de casa. Lá pelas tantas, o Rosas resolveu puxar uma conversinha com a Lourdes, já que ela nem sequer olhava para ele. Desajeitado, tirando o lenço perfumado do bolso, pigarreou e pediu à filha do patrão que fosse ao fundo do quintal. Moça educada, apesar de desconfiada, foi. Lá, em meio à penumbra, travou-se então o seguinte diálogo:
– A senhora não está mais usando a bicha no pescoço, por quê?
– Que bicha?
– A sineta que a senhora mandou pedir-me!
Pobre Rosas! Nunca mais foi visto em parte alguma da cidade...

NOTA: Publicado no “O Jornal”, edição 13.575, no ano de 1965.


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