sábado, 17 de setembro de 2016

A Missão dos Boraris

A primeira menção dos Boraris data de idos 1682, quando da chegada do missionário jesuíta Padre Antônio Pereira à missão de Nossa Senhora da Conceição dos Tapajós. Os Boraris, juntamente com os Cayoanas e Tapaipurus, foram descidos pelo dito missionário para a Missão dos Tapajós. A Aldeia dos Boraris ou Ibiraib (conforme cita o jesuíta João Daniel) ficava no rio Tapajós acima.


A grande perseguição, movida pelas tropas de resgate, permitiu aos índios deixarem a Missão e voltarem para suas antigas malocas. Em 1693 não há menção dos Boraris quando da divisão das Missões entre Jesuítas e Franciscanos. No entanto a taba dos Boraris não foi esquecida, tanto que em 1729, o padre missionário dos Tapajós - o Jesuíta Sebastião Fusco - mandou buscar novamente (fazer o descimento) os Boraris para a Missão dos Tapajós.

O padre e historiador jesuíta do século XVIII, José de Moraes, afirma em sua obra, publicada originalmente em 1759, que “subindo o rio Tapajós acima, à mão esquerda, em distância de sete léguas, está a aldeia de Borari, também da administração dos religiosos da Companhia. Esta aldeia estava unida com a dos tapajós até o ano de 1738, em que o padre Manuel Ferreira a separou para Borari, por causa de ser muito grande a aldeia de Tapajós, e não ter terras bastantes para a cultura de tantos índios”.

Assim, sabemos que a falta de alimentos, ou, mais especificamente de terra boa para plantio de roçados dos índios Tapajós, fez com que o Padre Manuel Ferreira instalasse a Missão dos Boraris, tendo em vista destes serem em menor número e dispunham de mais espaço de terras boas para o roçado. Para podermos ter uma ideia da importância desta aldeia, uma estimativa oficial feita em idos de 1730, relata que na Missão dos Tapajós existiam 793 índios enquanto na Aldeia dos Boraris (ainda não constituída em Missão, mas subordinada à Missão existente nos Tapajós), existiam 235 índios.

O Padre Manuel Ferreira, ao trazer alguns dos indígenas da Missão dos Tapajós para fundar a Missão dos Boraris, resolvia, assim, dois problemas: o da “superlotação” da Aldeia dos Tapajós e o de mão de obra já especializada e missionada para a Aldeia dos Boraris (Barbosa Rodrigues, citando um documento do Padre jesuíta Manoel Ferreira, diz que a mudança se deu por conta de uma epidemia de cursos (sic), entre os tapajós). Desde então, este lugar paradisíaco começou a ter residência fixa de sacerdotes entre os indígenas.

Alguns relatos nos dão conta de que ao menos outros dois sacerdotes jesuítas trabalharam como missionários entre os Boraris. Um, em idos de 1746, na pessoa do Padre Manuel dos Santos, o outro na pessoa do Padre Silveira de Oliveira, que foi o último missionário jesuíta em terra Borari, assumindo a Missão em dezembro de 1755 e ficando até a expulsão dos Jesuítas realizada em 1759.

Nesta época missionária surgiram alguns dos costumes que ainda hoje ainda fazem parte da cultura amazônica, como o Sairé, que recebeu contribuição da cultura portuguesa (como o mastro que é levantado em algumas festas de comunidades) e, posteriormente, em alguns casos, elementos da cultura negra. Além das contribuições indígenas como a culinária, o modo de pescar e caçar, na maneira de se construir canoas, no uso de plantas medicinais, entre outras coisas...

Em 06 de Março de 1758, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, cumprindo ordens do Rei de Portugal, Dom José I, extinguiu a Missão dos Boraris e criou a Vila de Alter do Chão. Nesta mesma ocasião era criada a Paróquia (ou Freguesia) de Nossa Senhora da Purificação.

Tanto a Paróquia como a Vila não conseguiram uma evolução política, social, econômica e religiosa satisfatória nos anos posteriores. Alter do Chão perdeu o predicamento de Vila em 1833 passando seu território (juntamente com o de Alenquer) a fazer parte do município de Santarém.

Importante aqui dizer que algumas pessoas pensam que Pedro Teixeira esteve em Alter do Chão. Essa ideia, divulgada por Ferreira Pena em idos de 1868, nasceu de uma interpretação de outra obra, escrita por Berredo. No entanto, em sua “Relação”, escrita em 02 de janeiro de 1639, Pedro Teixeira faz grande destaque aos Tapajós que viviam na foz do mesmo rio, não fazendo nenhuma referência aos Boraris, ou (aos atuais) Lago Verde ou Serra Piroca.

Além disso, outras fontes do século XVII, algumas delas escritas por membros da própria expedição de Pedro Teixeira (consulte-se as crônicas de Frei Laureano de la Cruz, Cristovam de Acunã, Maurício de Heriarte, Samuel Fritz) não fazem nenhuma referência sobre a presença de Pedro Teixeira além da taba dos Tapajós.

Vale a pena lembrar que, hoje, Santarém fica exatamente na foz do rio, o que não ocorria séculos atrás. Como bem descreve Angelo Brunelli, membro da expedição do Governador Mendonça Furtado em 1754, registrando a partida da Fortaleza dos Tapajós: “Retomamos a marcha, mas com grande lentidão por duas horas, mas depois com bom vento. Para retornar ao rio Amazonas é necessário retornar um pouco atrás”. Alie-se a isso o fato de que até o início do século XVIII, o rio Tapajós estava “fechado para exploração”. Ainda sobre esse assunto, o historiador Paulo Rodrigues dos Santos faz uma interpretação mais correta em sua obra “Tupaiulândia”, que não transcrevo aqui, mas que vale a pena ser consultada.


NOTA: Publicado no Livro “Alter do Chão e Sairé: Contribuição para a história”, publicado pelo autor do blog em 2014.

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