sábado, 31 de outubro de 2015

Artigo: O Lazareto de Paracary

Por Pe. Sidney Augusto Canto

Nos anais da medicina em nossa região, há uma história esquecida, talvez por conta do seu desfecho, mas que merece ser mantida viva para a posteridade. É a história do Lazareto de Paracary, que começou em 1856, quando o lavrador Antônio Francisco Pereira da Costa, começou a administrar um tratamento com remédios caseiros a um negro que estava sofrendo de morfeia.


Como o referido doente apresentasse considerável melhora, logo espalhou-se em Santarém que o mesmo Antônio Francisco havia encontrado a cura para a morfeia. Logo acorreram-lhe doentes de Santarém e da região. Não demorou muito tempo e pessoas de toda a Província do Pará e de outras até, começaram a acorrer ao “curandeiro” com esperança de curar uma moléstia, até então sem cura.

Sem recursos para manter tantas pessoas, Antônio construiu em sua propriedade o Lazareto composto de dois casebres. Lá ficavam doentes de lepra, elefantíase e outras enfermidades dermatológicas da época. Jornais locais louvavam a descoberta da suposta “cura” e reclamavam do Governo da Província uma “ajuda para tão grandiosa obra”. O governo então destinou uma renda mensal de 100$000 réis (verba imperial) para o Lazareto e pagava a diária de 800 réis (verba provincial) para diária de manutenção dos doente pobres.

As coisas pareciam caminhar para colocar Paracary (que na época pertencia ao município de Santarém) como o lugar da descoberta da cura da morfeia, mas não foi o que aconteceu. Após dois anos, algumas pessoas apresentavam somente melhoras e outras, apesar de se dizerem curadas, ainda apresentavam sintomas da doença. Outros haviam morrido durante o tratamento.

Em 1858 o médico da Colônia Militar de Óbidos, o Dr. José Veríssimo de Mattos, visitou, a pedido do Governo, o Lazareto de Paracay. Verificou o estado de alguns doentes e, apesar de constatar a melhora de algumas pessoas doentes, colocou-se prudente com relação à cura da morfeia pelo tratamento curativo ali administrado.

No ano seguinte, alguns morféticos (seis pessoas) chegaram à capital da Província reclamando não somente da ausência da cura esperada como também do tratamento que recebiam no Lazareto do senhor Antônio Francisco. O fato ganhou a imprensa e o Presidente da Província, Tenente Coronel Manoel de Frias e Vasconcelos, nomeou uma comissão a fim de verificar o que de fato, passava-se em Paracary.

A comissão, formada por médicos, ficou assim composta: Dr. Francisco da Silva Castro (inspetor da saúde pública), Dr. Camilo José do Valle Guimarães (provedor da saúde do porto da capital) e Dr. Américo Marques de Santa Rosa (do hospital militar). Esta comissão apresentou seu relatório em 17 de julho de 1859, constatando que a principal planta usada por Antônio Francisco Pereira da Costa era denominada Paracary acrescida de outras ervas locais. E que, apesar de toda boa vontade do “curandeiro”, que parecia não agir de má fé, concluindo-se que a doença não tinha cura. Por outro lado, não havia e as condições do Lazareto eram as mais precárias possíveis. Diante disso, o governo retirou a contribuição monetária.

Sem ajuda monetária e colocada a dúvida científica no tratamento efetuado, o Lazareto cumpriu seu destino de desaparecer... Não pode, entretanto, desaparecer de nossa memória, a experiência nascida da medicina popular na região do Baixo Amazonas.

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