quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Artigo: O Catecismo do padre Bettendorff


Por padre Sidney Augusto Canto

Muito ainda há que se estudar sobre a pessoa do Padre João Felipe Bettendorff, SJ. Mais do que o fundador da Missão Jesuíta entre os índios Tapajós, Pe. Bettendorff foi um missionário que procurou compreender a Amazônia e dedicou a maior parte de sua vida (de 1660 a 1698) a esta nossa terra e aos diversos povos indígenas que aqui existiam.
Contemporâneo do Padre Antônio Vieira, não deixou de ser maior do que este em seu trabalho pastoral e também nas obras escritas. Pe. Bettendorff foi um dos padres Jesuítas que mais escreveu sobre a Amazônia no século XVII. Muitas de suas cartas continuam inéditas (possuo cópia de duas delas, que encontrei nos arquivos da Biblioteca do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro – IHGB). Escreveu diversos livros, entre eles diversos “Catecismos” (um deles foi escrito na língua dos “Tapajós” e outro das dos “Urucucus”, tribos que foram missionadas por ele na Missão de Nossa Senhora da Conceição dos Tapajós).

Recentemente, chegou-me às mãos o seu “Compendio da Doutrina Cristã na Língua Portuguesa e Brasílica”, que teve uma primeira edição no ano de 1684, e uma segunda, feito a mando de Dom João VI, enquanto Príncipe Regente, no ano de 1800. Uma obra que vale a pena ser lida não somente pelo caráter religioso e histórico, mas também pela riqueza de uma época que parece distante no tempo, mas que mantém ecos na vida do povo nos dias atuais.
Dividido em duas partes (orações e doutrinas) o “Compêndio” traz ainda o ritual para batizar em casa, em perigo de morte e também o modo como se devem acompanhar os moribundos antes da morte.
Naquele tempo, a Catequese Doutrinal era, além dos Sacramentos, o principal “trabalho pastoral” dos missionários. Por isso, o próprio Pe. Bettendorff oferece aos “usuários” de sua obra, em uma pequena introdução, indicando o modo como deveria ser ensinada a doutrina:

O Doutrineiro (que no Compêndio vem indicado pela palavra “Mestre” em oposição aos doutrinados, indicados pela palavra “Discípulo”) posto diante de todos, em lugar mais chegado ao Altar, faz com eles o sinal da Santa Cruz em voz alta, clara e distinta, e diz o Padre Nosso, a Ave Maria, o Credo, os Mandamentos da Lei de Deus, e da Santa Madre Igreja Católica: os Sacramentos e as Virtudes Teologais, com o mais que conforme as circunstâncias lhe parecer melhor.
Depois disso faz as perguntas, as quais respondem comumente todos, tirado nos dias de Domingo, e Festas em que se faz a Doutrina geral depois do jantar (nosso almoço de hoje, na época). Acabadas as perguntas, se põem todos de joelhos, e dizem a Confissão geral, com o Ato de Contrição.

A doutrina, que podia ser feita de uma vez, ou em mais vezes conforme o caso (e mais comumente feito nas Missões), terminava sempre com a entoação de cânticos. Em dias de sábado e Festas “Marianas” ainda era entoada as Ladainhas e a Salve Rainha.
O “Compêndio” foi publicado de forma bilíngue, Pe. Bettendorff teve o cuidado de indicar algumas orientações com relação à pronúncia da “língua brasílica” (tupi) para facilitar o ensinamento por parte dos padres que usariam o livro na catequese dos indígenas. Transcrevemos aqui, da edição do ano de 1800, a oração do PAI NOSSO, conforme escrita pelo ilustre jesuíta, fundador da Missão da foz do Tapajós, e ensinada por ele aos nossos antepassados:

Ore rûb, ybákype tocoár, imöetépyramo nde rêra töicó. Töúr nde Reino: Tonhe monhang nde remimotâra, ybýpe, ybâkype inhemonhânga iabé: Ore rembïú âra iabiõ ndöára ëimëêng corí orébe: ndenhirõ ore angaipâba recé orébe, Orérerecomemoãçâra çupé orenhirõ ïabé: Oremoarucârumé ïepé tentaçaõ pupé, orepycyrõ te ïepe mbäé äiba çüí. Amem Jesus.


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