Por Rui
Guilherme Barata
Chico, não é o poema que me traz aqui
neste momento.
Não é o poema, Chico, é este cansaço,
este medo de ter tantos caminhos,
Tantos e tão poucos satisfazem.
Não é o poema, Chico, é este desejo de
contigo sair por estas velhas ruas,
Velhas ruas onde há muito envelhecemos,
Porque – sabes, Chico? – vazio é o nosso
olhar de todas as promessas
E nossas almas teem para mais de mil e
tantos anos.
Vamos, Chico, não me negues a graça da
presença.
Se eu te pedir a lua, por favor, vai
correndo buscar,
Se eu te pedir a estrela, manda a
empregada comprar,
Se eu desejar a morte. – Por que me
fazer esperar?
Vamos, Chico, toma o teu anjo e vem, que
este cansaço
É tão grande, é tão triste, é tão
pesado,
Maior que a solidão, maior que o mundo,
Muito maior que o tédio e que o pecado.
Vamos, Chico, esta noite floresce na
legenda que é tua
Ninguém estranhará se nos beijarmos,
Ninguém gargalhará se então chorarmos
Como dois bêbados que se encontram na rua.
Vamos, Chico,
leva-me nas asas do teu anjo,
Leva-me do riso,
arrasta-me do pranto,
Pois loucura
maior é impossível esperar
Estas horas
longas, estas longas horas
E que jamais,
jamais podemos parar.
Vamos, Chico,
muito temos que andar
Nosso rumo é o
cemitério
Onde quero
descansar.
Plantaremos nossas
flores,
Pintaremos nossa
cruz,
Abriremos nossa
cova
E depois – pela madrugada
–
Quase mortos de
cansaço,
Deitaremos calmamente
À espera do
milagre.
Vamos, Chico, dá-me o teu braço que eu
estou cheio de pecados,
Dá-me o teu ombro que este nojo é bem
maior,
E orações, poesia, amor não satisfazem,
Se me desamparares, tombarei.
Ó Chico, além de nós é o tempo
dissolvente,
Amantes que nos beijam, telefones que
nos chamam, cartas que escrevemos
E esta ânsia louca de fugir do tédio,
Que é o mais trágico e mortal de todos
os venenos.
Vamos, Chico, a
memória dos versos não comove,
Guardemos o
epitáfio, pois degrada,
Deixemos este
crime para os vivos,
Que a poesia não
resolve nada.
Vamos, Chico,
quero cobrir meu Deus de desespero,
Vamos depressa
antes que o sol me chame
A outro mistério
que não sejas tu.
NOTA: Poesia escrita
em Belém pelo poeta santareno e publicada em 26 de novembro de 1944 no “O
Jornal”, do Rio de Janeiro.
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