Pe. Sidney Augusto Canto (*)
Antes da construção da atual
Igreja Matriz de Santana, havia apenas uma capela, no antigo Forte, que tinha
como orago e padroeiro Santo Antônio. A aldeia missionária propriamente dita
ficava junto à foz do rio Trombetas. Lá construíram os frades franciscanos a
primeira capela em honra a Santa Anna, avó de Jesus. É esta capela que podemos
ver no prospecto desenhado por Schuwebel, no ano de 1756 (vide na ilustração).
Com a criação da Vila e
Paróquia de Óbidos, ocorrida em 25 de março de 1758, foi escolhido e demarcado
o largo do Pelourinho, junto ao qual deveria ser construída a nova Igreja
Matriz (vide nota 01). Sabe-se que o primeiro Bispo que visitou Óbidos, Dom
Frei João de São José, nos faz a primeira referência sobre a nova igreja
dizendo que era uma “igreja ordinária,
coberta de folha” (palha). Nela o bispo celebrou missa e crismas, além de
atestar a devoção indígena local à Santa Anna, que então estava sob os cuidados
paroquiais do frade carmelita Frei Francisco de Sales, não contando a freguesia
mais do que 300 almas.
Foi somente em 1784 que o sonho
da atual igreja matriz começaria a se tornar realidade. No dia 23 de outubro
daquele ano, aportava na Vila de Óbidos o Governador do Grão-Pará, Martinho de
Souza e Albuquerque que, acolhido pelo Senado da Câmara, foi conduzido à igreja
paroquial de Santa Anna, onde ouviu missa celebrada pelo seu capelão e:
(...)
sendo representado a grande ruína que havia a dita igreja, e a precisão e o
desejo que tinha a Irmandade da dita Santa [Anna] de edificar outra em o lugar
que fosse mais próprio, ouviu o sargento-mor engenheiro sobre a escolha do
terreno, encarregando-o da delineação de um risco para ela (...).
O sargento-mor engenheiro em
questão trata-se de João Vasco Manoel de Braum, que acompanhava a expedição do
Governo e foi o responsável pela planta original da nova Matriz de Santa Anna,
em Óbidos. A obra foi confiada à Irmandade de Santa Anna, que para dispor de
recursos pecuniários para a edificação da mesma, conseguiu a posse de dois
cacauais e escravos com permissão dada por meio de carta régia de 02 de janeiro
de 1802. Foi assim, com base na mão de obra escrava e com a venda de cacau que
se construiu a atual Matriz Obidense.
Em 1788 os trabalhos de
construção ainda não haviam sido iniciados, pois o Bispo do Pará, Dom Frei
Caetano Brandão, abrindo visita Pastoral em Óbidos no dia 24 de dezembro
daquele ano, celebrou os ofícios litúrgicos ainda na antiga matriz, da qual fez
a seguinte descrição: “A Igreja é
demasiada pequena para o número de Fregueses; está, porém, asseada no seu tanto
e pode passar pelo que respeita às alfaias”.
Enquanto os trabalhos de
construção não iniciavam, as cerimônias ocorriam na antiga capela construída
pelo primeiro pároco de Óbidos, em taipa e coberta de palha, e com a falta de
muitos materiais, como podemos observar de uma lista feita em 1799 sobre o que
faltava para a antiga igreja paroquial:
Uma caldeirinha, seis castiçais, uma lâmpada,
uma ambula para o Sacrário, um purificatório, um vaso para a comunhão, uma cruz
processional, um sino, dois pluviais branco e roxo, uma umbela, quatro frontais
das cores do templo, um véu de cálice roxo, um dito verde, uma manga de cruz
branca, uma dita roxa, três toalhas de altar, duas ditas para a mesa da
Comunhão, duas ditas para o lavatório, dois amictos, um véu de ombros.
Não temos a data correta do
início dos trabalhos, sabemos, entretanto, que os mesmos correram a passos
lentos. Enquanto isso, no início do século XIX, uma nova capela foi construída
na Vila de Óbidos (vide nota 02), para reparar o sacrílego ato do roubo das
hóstias, foi construída uma capela do desagravo, próxima ao antigo cemitério,
no lugar onde as hóstias foram encontradas.
Em 04 de maio de 1821, a Junta
Governativa do Grão-Pará, solicitava providências do Juiz Ordinário da Vila de
Óbidos sobre a situação paroquial, julgando que a antiga matriz, construída na
época em que fora criada a paróquia, apresentava um aspecto “deplorável e
indecente”. As autoridades civis e eclesiásticas se reuniram para debater o que
fazer, diante destas circunstâncias. Como a antiga Matriz não oferecesse mais
condições dignas para o culto sagrado, o novo pároco de Óbidos, padre Raimundo
Sanches de Brito, sugeriu transferir a Matriz para a nova Capela do Desagravo.
Quanto à primeira igreja matriz, depois de servir ao povo por pouco mais de 60
anos, foi entregue à ruína naquele mesmo ano de 1821...
NOTA
01: O historiador Arthur Cézar Ferreira Reis, denomina esta primeira Matriz
como a antiga igreja dos padres da Piedade. Não é exatamente esta a verdade. Os
padres da piedade tinham sua capela junto à missão indígena, que ficava
localizada junto à foz do rio Trombetas.
NOTA
02: O cônego Francisco Bernardino de Souza, escrevendo no ano de 1873 sobre o
fato sacrílego que levou à construção da capela do Desagravo, o coloca como
ocorrido na época da Cabanagem, acusando os cabanos do roubo da ambula com as
sagradas hóstias. O fato é que tanto o ato sacrílego como a construção da
capela do Desagravo, que foi a segunda Matriz de Óbidos, são anteriores ao
período da Cabanagem.
(*)
O autor é pós-graduado em História da Amazônia pela Faculdades Integradas do
Tapajós – FIT. Fundador e primeiro presidente do Instituto Histórico e
Geográfico do Tapajós – IHGTap e membro da Academia de Letras e Artes de
Santarém – ALAS.
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