sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Notícias esportivas e sociais de Fordlândia em 1931

Nestas paragens selváticas e recônditas do negro Tapajós, onde apenas o braço pouco potente do homem operava em mui limitadas explorações, o poderoso “Rei do Dólar” veio fazer enormes e súbitas transformações. Em pouco, Boa Vista viu abaterem-se as suas viridentes comas e, em lugar delas, surgirem tetos reluzentes. Viu as veredas sinuosas de animais silvícolas se transformarem em ruas amplas e direitas para humanos e civilizados transeuntes. Em vez de uma atmosfera carregada de miasmas mortíferos, um clima salubérrimo. Em lugar do concerto rústico da passarada, sons cadenciados de orquestras. Em vez da tristeza de anteriores noites sombrias e tétricas, o gargalhar animado, o esboçar de lindos sorrisos que chocam o coração, prazenteiros bailes em iluminados salões.
Vai assim Boa Vista em uma completa e perfeita evolução.

Agora mesmo, no dia 24 de dezembro (1931), o “Amazônia Atlético Clube”, sociedade de esforçados, que zombam de empecilhos e não desanimam mesmo ante a derrota, inaugurou a sua bela sede. Ganha Boa Vista mais um mimoso lugar para diversões.
O ato da inauguração não teve a desejada concorrência em virtude da sequência de três feriados, motivo porque se esfacelou o povo de Boa Vista para diversas pontas.
Contudo, procedeu-se a cerimônia de inauguração com avultada assistência, obedecendo o seguinte programa:
Compôs-se a mesa da Diretoria de Honra. Para presidente de honra foi convidado pelo vice-presidente em exercício, o inteligente moço Raymundo Tontes, o nosso ilustre contador, sr. Onésimo Souza. Ladeou-o pela direita o nosso criterioso delegado regional, sr. Brigada Antônio Meireles Muniz; o secretário efetivo, sr. Antônio Bezerra Granja; representantes da Liga de Esportes de Boa Vista, representantes das unidades esportivas locais – U. S. C.; A. E. C. e Y. S. C.
A esquerda foi ladeado pelo vice-presidente em exercício; Dr. A. Siqueira Mendes, abalizado médico que, com a sua sensata atuação clínica, tem construído uma verdadeira fortaleza de simpatias entre nós; sr. João Braga, o nosso estimado, esforçado e abnegado presidente efetivo; Germano Garro, benemérito e dedicado diretor esportivo; Pedro Fernandes Bezerra, orador oficial.
Assim constituída a mesa, o presidente de honra, numa bela alocução, abriu a sessão extraordinária de inauguração. Logo após, no alto do Coreto, senhoritas exibiram a flâmula do Amazônia, ladeada pelos pavilhões Nacional e Norte Americano, enquanto o hino do Amazônia, composição do hábil musicista Raymundo Fona, se fazia ouvir em notas maviosas.
Proferiu-se o discurso oficial. Seguiu lhe, com palavra fluente e precisa, o nosso delegado regional, felicitando o A. A. C. pelo termo do notável acontecimento, admirando sobretudo que as derrotas em campo não o desanimam nas lutas. Orou, em seguida, o sócio João Falcão, que reproduziu bem a significação daquela solenidade.
A Liga de Esportes, por intermédio de um de seus representantes, congratulou-se, parabenizando o A. A. C. O presidente de honra deu por encerrada a sessão após a leitura da ata da mesma, que foi assinada por todos.
Iniciou-se a segunda parte da festa, correspondendo à maior ânsia dos espectadores: o baile. Agora, o eutérpico “Olympia Jazz”, de propriedade do proficiente maestro Raymundo Fona, encheu o vasto salão de inebriantes sons, aliciando todos ao prazenteiro torvelinho da dança. Reina o prazer, cordialidade, até as 5 da manhã. Fez-se aí ponto final à festa de inauguração de nossa sede.
Todavia, no dia 25 de dezembro, o sr. Fona, por benévola gentileza, voltou ao nosso meio e, no espaço de 4 horas, recreou-nos com o variado repertório da sua mágica orquestra.
Houve então mais satisfação, espontâneo entusiasmo que anteriormente, a ponto de não poder se retirar o sr. Fona senão fazendo diversas paradas em caminho para atender ao – toque mais uma... mais uma... umazinha... e foi-se afinal deixando-nos com a sede insaciável de prover.
Suponhamos que o sr. Fona tivesse ido de uma vez para não voltar mais. Imaginem a nossa surpresa quando no dia 26 de dezembro se nos apresenta e, com a sua orquestra, mais afinada. Parece que tinha ido tomar novas lições de Euterpe.
As cordas do seu instrumental vibraram com sonoridade mais embevecedora. Os seus sopranos tiraram notas mais acuradas e entontecedoras. Reinaram novamente prazer e folia. Assim o “A. A. C.”, durante 3 dias consecutivos, festejou garbosamente a inauguração da sua sede.


NOTA: Publicado no Jornal Gazeta do Norte de 09 de janeiro de 1932.

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