Nestas paragens
selváticas e recônditas do negro Tapajós, onde apenas o braço pouco potente do
homem operava em mui limitadas explorações, o poderoso “Rei do Dólar” veio
fazer enormes e súbitas transformações. Em pouco, Boa Vista viu abaterem-se as
suas viridentes comas e, em lugar delas, surgirem tetos reluzentes. Viu as
veredas sinuosas de animais silvícolas se transformarem em ruas amplas e
direitas para humanos e civilizados transeuntes. Em vez de uma atmosfera
carregada de miasmas mortíferos, um clima salubérrimo. Em lugar do concerto
rústico da passarada, sons cadenciados de orquestras. Em vez da tristeza de
anteriores noites sombrias e tétricas, o gargalhar animado, o esboçar de lindos
sorrisos que chocam o coração, prazenteiros bailes em iluminados salões.
Vai assim Boa
Vista em uma completa e perfeita evolução.
Agora mesmo, no
dia 24 de dezembro (1931), o “Amazônia Atlético Clube”, sociedade de
esforçados, que zombam de empecilhos e não desanimam mesmo ante a derrota,
inaugurou a sua bela sede. Ganha Boa Vista mais um mimoso lugar para diversões.
O ato da
inauguração não teve a desejada concorrência em virtude da sequência de três
feriados, motivo porque se esfacelou o povo de Boa Vista para diversas pontas.
Contudo,
procedeu-se a cerimônia de inauguração com avultada assistência, obedecendo o
seguinte programa:
Compôs-se a mesa
da Diretoria de Honra. Para presidente de honra foi convidado pelo
vice-presidente em exercício, o inteligente moço Raymundo Tontes, o nosso
ilustre contador, sr. Onésimo Souza. Ladeou-o pela direita o nosso criterioso
delegado regional, sr. Brigada Antônio Meireles Muniz; o secretário efetivo,
sr. Antônio Bezerra Granja; representantes da Liga de Esportes de Boa Vista,
representantes das unidades esportivas locais – U. S. C.; A. E. C. e Y. S. C.
A esquerda foi
ladeado pelo vice-presidente em exercício; Dr. A. Siqueira Mendes, abalizado
médico que, com a sua sensata atuação clínica, tem construído uma verdadeira
fortaleza de simpatias entre nós; sr. João Braga, o nosso estimado, esforçado e
abnegado presidente efetivo; Germano Garro, benemérito e dedicado diretor
esportivo; Pedro Fernandes Bezerra, orador oficial.
Assim
constituída a mesa, o presidente de honra, numa bela alocução, abriu a sessão
extraordinária de inauguração. Logo após, no alto do Coreto, senhoritas
exibiram a flâmula do Amazônia, ladeada pelos pavilhões Nacional e Norte
Americano, enquanto o hino do Amazônia, composição do hábil musicista Raymundo
Fona, se fazia ouvir em notas maviosas.
Proferiu-se o
discurso oficial. Seguiu lhe, com palavra fluente e precisa, o nosso delegado
regional, felicitando o A. A. C. pelo termo do notável acontecimento, admirando
sobretudo que as derrotas em campo não o desanimam nas lutas. Orou, em seguida,
o sócio João Falcão, que reproduziu bem a significação daquela solenidade.
A Liga de
Esportes, por intermédio de um de seus representantes, congratulou-se,
parabenizando o A. A. C. O presidente de honra deu por encerrada a sessão após
a leitura da ata da mesma, que foi assinada por todos.
Iniciou-se a
segunda parte da festa, correspondendo à maior ânsia dos espectadores: o baile.
Agora, o eutérpico “Olympia Jazz”, de propriedade do proficiente maestro
Raymundo Fona, encheu o vasto salão de inebriantes sons, aliciando todos ao
prazenteiro torvelinho da dança. Reina o prazer, cordialidade, até as 5 da
manhã. Fez-se aí ponto final à festa de inauguração de nossa sede.
Todavia, no dia
25 de dezembro, o sr. Fona, por benévola gentileza, voltou ao nosso meio e, no
espaço de 4 horas, recreou-nos com o variado repertório da sua mágica
orquestra.
Houve então mais
satisfação, espontâneo entusiasmo que anteriormente, a ponto de não poder se
retirar o sr. Fona senão fazendo diversas paradas em caminho para atender ao –
toque mais uma... mais uma... umazinha... e foi-se afinal deixando-nos com a
sede insaciável de prover.
Suponhamos que o
sr. Fona tivesse ido de uma vez para não voltar mais. Imaginem a nossa surpresa
quando no dia 26 de dezembro se nos apresenta e, com a sua orquestra, mais
afinada. Parece que tinha ido tomar novas lições de Euterpe.
As cordas do seu
instrumental vibraram com sonoridade mais embevecedora. Os seus sopranos
tiraram notas mais acuradas e entontecedoras. Reinaram novamente prazer e
folia. Assim o “A. A. C.”, durante 3 dias consecutivos, festejou garbosamente a
inauguração da sua sede.
NOTA: Publicado
no Jornal Gazeta do Norte de 09 de janeiro de 1932.
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