sábado, 13 de fevereiro de 2016

A revolta de Jacareacanga em Santarém – 1956

Santarém Viveu Dias de Intranquilidade e Expectativas

Nos primeiros dias da última semana, as estações difusoras do Rio, transmitiram notícias de que dois oficiais da FAB haviam fugido do Campo dos Afonsos num avião de treinamento avançado, refugiando-se no aeroporto de Cachimbo, situado no seio da Selva, entre as cabeceiras dos rios Xingu e Tapajós. Posteriormente outras notícias diziam que os referidos oficiais fugitivos haviam ocupado também o aeroporto de Jacareacanga no vizinho Município de Itaituba. Esses oficiais sediciosos eram o Major Haroldo Veloso e o capitão Lameirão, ambos da FAB sendo o primeiro muito conhecido em Santarém.

O comando da 1ª Zona Aérea sediado em Belém fez seguir então para Jacareacanga um aparelho da FAB conduzindo um destacamento sob o comando do Major Paulo Vitor e assistido pelo Tte. Carlos Peti, com a missão de prender os oficiais rebeldes, levando-os para Belém. Entretanto o Major Paulo Vitor e as praças do destacamento aliaram-se aos sediciosos, com exceção do Tenente Carlos Petit que ficou então como prisioneiro. Com essa adesão ficou o Major Haroldo de posse de mais uma avião, mais armas e mais pessoal, e planejaram o assalto ao aeroporto de Santarém, o que levaram a efeito na madrugada do dia 16 do corrente.
Nesse mesmo dia os oficiais revoltosos desceram para a cidade de gip (sic) com metralhadoras em punho e com pistolas à cinta indo ao edifício dos Correios e Telégrafos retirando os cristais da aparelhagem radiotelegráfica o mesmo fazendo nas estações da Panair e Loide Aéreo Nacional, impedindo que Santarém se comunicasse com o exterior. Sempre empunhando suas armas o major Haroldo Veloso e o capitão Lameirão visitaram a Capitania dos Portos, a Rádio Ypiranga e outros locais. A população entrou em pânico, os boatos fervilharam e cerca de um terço dos moradores da cidade retiraram-se para sítios e fazendas do interior.
Corria pela cidade o boato de que os oficiais rebeldes contavam com o apoio da Marinha e que este era apenas o começo de uma revolução em grandes proporções que estaria para rebentar no seio da Aeronáutica. Com o Correio e os Bancos fechados, o nosso aeroporto interditado, a vida da cidade ficou reduzida a pequenos grupos que pelos cantos comentavam cada qual dando palpites a seu modo quanto o desfecho que teria o movimento rebelde cujo foco estava no aeroporto, já aumentando com a participação de voluntários e com a aquisição de maior número de armas, de vez que o major Veloso arrombando a sede do Tiro de Guerra, carregou com o armamento e munição dali existentes. Indo a Belterra os oficiais revolucionários apoderaram-se da estação transmissora da IAN obstruindo também a pista de aterrissagem.
Aviões da FAB sobrevoavam a cidade diariamente em reconhecimento, sem poderem pousar a pista obstruída com tambores de gasolina. Nesse interim, as estações transmissoras começaram a noticiar que uma poderosa expedição armada se aprestava para vir expulsar os sediciosos de Santarém. Já a expedição se aproximava da cidade quando na tarde de 22 um avião Catalina em voo rasante, metralhou o reduto dos revoltosos no aeroporto, abalando profundamente o moral dos mesmos.
A FUGA:
Logo após a façanha do Catalina desceu no aeroporto o Douglas dos sediosos que se achava em reconhecimento trazendo a alarmante notícia que a expedição das forças legais se aproximava. Estabelecido o pânico no seio dos rebeldes, empreenderam imediatamente a fuga para o campo de Jacareacanga, levando os seus soldados e todo o armamento inclusive armas e munições que haviam carregado da sede do nosso Tiro de Guerra. E então os elementos aliciados que os auxiliaram azularam para Belterra, caindo na mata.
A situação modificou-se imediatamente porque o tenente Carlos Pety de Araújo que estava preso por não ter querido aderir ao movimento assumiu o comando da guarnição da FAB no aeroporto local. A tranquilidade e a confiança voltaram então ao seio da população, enchendo-se as ruas de transeuntes, a alegria dominando todos os espíritos antes tão sobressaltados pela incerteza dos trágicos acontecimentos que poderiam acontecer.
E para a maior satisfação da população atribulada, amanheceram no dia 24 fundeados em nosso porto o vapor Presidente Vargas conduzindo 500 soldados e oficiais do Exército e da Aeronáutica com copioso armamento pesado e os navios de guerra Cananéia e Carioca que vieram escoltando o navio de transporte. Desembarcada parte da tropa, foi eficientemente guarnecido o aeroporto, os bancos e outros pontos da cidade, com soldados fortemente armados e municiados. Biplanos de caça da FAB sobrevoaram a cidade em lindas evoluções.
A expedição militar veio sob o comando do Brigadeiro Alves Cabral comandante da 1ª Zona Aérea padrão de bravura e fidelidade aos princípios democráticos.
E como os chefes revoltosos não mais se encontravam em Santarém, a expedição seguirá para Jacareacanga a fim de captura-los, sendo este o escapo da força expedicionária: Perseguir os rebeldes até sua prisão.
VÁRIAS:
Nos dias em que os rebeldes dominaram Santarém, diversas patrulhas foram espalhadas por pontos estrangeiros da cidade, como o Trapiche, a Serraria I. B. Sabá, etc. de onde faziam disparos contra embarcações que demandavam nosso porto.
Felizmente não se registraram desatinos nem desrespeito as famílias nem assaltos ao comércio por parte dos sediosos. Tudo que compravam pagavam.
- X -
Sabe-se que vai ser apurada em inquérito policial militar a participação do destacamento de polícia sediada em Santarém, direta ou indiretamente, no movimento sedioso. O talhador de carne Joacy Cota faz abertamente fortes acusações ao Delegado de Polícia e seus soldados, de arbitrariedades sofridas por ele.
Do Deputado Santino Sirotheau recebeu o Dr. Armando Nadler o seguinte telegrama: Belém – Prefeito Armando Nadler – Santarém – Na pessoa prezado amigo qualidade chefe município parabenizo povo nossa terra pela sua libertação domínio insurretos maus brasileiros quando mais se faz necessário calma compreensão poder presidente Juscelino executar patriótica ação seu governo pt Falta absoluta comunicação impediu-me minha manifestação solidariedade contorto nossos conterrâneos logo seja reestabelecida comunicação aérea viajarei para minha querida Santarém pt abraços – SANTINO SIROTHEAU CORRÊA”.


NOTA: Publicado originalmente no Jornal de Santarém, de 25 de fevereiro de 1956. Acervo ICBS.

Um comentário:

  1. Eu fui um, que com minha família, saímos da cidade e fomos para o outro lado do rio Amazonas(Urucurituba) onde permanecemos até o fim da situação

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