“O Dr. Herculano Marcos Inglez de Souza, tão pouco conhecido nesta
Província quanto o é nas outras, é nada mais e nada menos do que um desses
meninos que há 18 anos atrás traquinavam e brincavam nesta cidade.
Mas
o menino que ontem aventurava seus passos vacilantes na estrada da vida é hoje
um dos mais distinto filhos do orgulhoso rei dos rios, e se já não é uma literatura, como se disse do imortal
José de Alencar, é sem dúvida um dos nossos esperançosos literatos, um romeiro
infatigável da longa jornada das letras, e ao mesmo tempo um jornalista de
grande crédito.
Nascido
na cidade de Óbidos em 1853, a sua imaginação ardente como o sol do Equador que
alumiou seu berço, sua cabeça repleta das harmonias e grandezas do seu pátrio
rio, não podiam trocar as cenas singelas e variadas desta vasta e majestosa
natureza pelas pálidas divindades gregas e romanas, ou por essas proezas da
cavalaria da Idade Média.
Com
efeito, nas suas produções literárias que correm impressas e ocupam as atenções
da imprensa e do mundo ilustrado, procurou ele sempre tornar conhecidas as
crenças, hábitos e costumes das duas províncias banhadas pelas águas do
Amazonas, especialmente os desta, que ama como sua e o atestam suas obras.
Dedicando-se
por vontade de seus pais ao estudo das ciências jurídicas e sociais na Academia
do Recife, onde conquistou um nome invejável pelo seu não vulgar talento e pelo
seu trato ameno e delicado, teve de remover-se no seu 4º ano para a de São
Paulo, onde formou-se em direito em 1876 com geral aplauso de seus colegas e contemporâneos,
e louvores de seus ilustres professores.
Como
jornalista fundou e redigiu o Lábaro,
jornal acadêmico destinado à crítica literária; redigiu o importante Diário de Santos, e na cidade deste
nome, onde seu ilustre pai, hoje desembargador da Relação do Ceará, era então
festejado juiz de direito, foi perseguido e quase preso por questões políticas,
como consta dos jornais, merecendo por sua nobre atitude, e ainda mais pelo
vigor e energia com que vibrava golpes de morte na situação descabida, os
elogios da imprensa da corte e de várias províncias.
Voltando
a São Paulo, ali fundou a Tribuna
Liberal, órgão do partido liberal, de companhia com os ilustres chefes
liberais, conselheiro José Bonifácio, desembargador Gavião e dr. Leôncio de
Carvalho, atual ministro do império, sendo sempre por estes vultos de nossa
política estimado, considerado e atendido, tanto pela energia consorciada com a
linguagem moderada e argumentação cerrada com que defendia os princípios
liberais, e combatia os erros e desmandos da passada situação política,
especialmente na parte relativa à administração provincial, merecendo por esses
e outros títulos a estima dos paulistas e os sufrágios gerais do partido no
último pleito eleitoral para deputados provinciais.
Como
literato, fundou a Revista Nacional de ciências,
artes e letras e publicou os seguintes romances de costumes do Amazonas:
História de um Pescador; Cacoalista; Feiticeira, Amor que mata; o Recruta; O
Sineiro da Matriz; O Coronel Sangrado; e Acanan – dos quais muito lisonjeiramente
se tem ocupado a imprensa.
Em
todas essas produções, nas quais brilha o gênio por entre a variedade das cenas
e das imagens, como o sol por entre as nuvens, o jovem romanista abandonou
inteiramente o sublime extravagante próprio da sua idade para ligar-se à escola
do século atual, substituindo o vago dos sonhos e dos mistérios da mitologia
pela realidade desta grandiosa e imponente natureza que o viu nascer,
conservando-nos assim na esfera de nossas crenças, hábitos e costumes, sem
contudo faltar a combinação do real com o ideal, que caracteriza a escola que
segue.
Eis
aqui em ligeiros traços o jovem e talentoso literato e jornalista político, que
tanto honra o Amazonas.
Falta-nos
tempo para apreciarmos detidamente cada uma de suas produções literárias que
temos à vista, mas basta o que ai fica dito para revelar o nosso juízo acerca
do merecimento delas e do jornalista”.
NOTA: Publicando no Jornal
Amazonas Nº 110, de 1878.
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