São João, neste
ano, deitou as manguinhas de fora.
Dos recônditos
labirintos da Aldeia, às remansosas plagas prainhenses, formigavam as fogueiras
numa alacridade única, a festejar o santo da pataqueira, da manjerona e da
priprioca.
A “bicharada”,
na ânsia de escapar às garras do Malheiros, caiu na farra, ao som dos pinhos e
dos zambubas.
O “cisne”, o
“japiim”, a “pipira”, a “borboleta”, a “preguiça”, o “boi”, farandularam até a
madrugada.
À meia noite, à
hora dos mistérios e dos encantamentos, já era intenso o curiosíssimo o
movimento de banhistas que, procurando as “frescas águas do Tapajós”, iam
deixar aos retardatários a caipora, o azar, a urucubaca, de envolta com o
perfume acre e delicioso das ervas mandingueiras.
Ao morrente
relampejo das últimas brasas, pares ingênuos cercavam o rescaldo fumegante dos
sacais, na cerimônia característica dos compadrios e parentescos de fogueira, a
encobrir, bastas vezes, as primícias de afeição mais terna que o futuro
revelará.
De vez em vez,
uma cuia contendo complicada manipulação de ervas cheirosas e raízes misteriosas,
era trazida por alguém e passada, em três rondas, sobre o cinzeiro escaldante.
Era a loção para o banho.
E Santarém toda,
a alma popular, radiosa, vibrava numa alegria imensa, cristalina, de risos,
cantos e músicas, na festiva noite do Precursor.
Já no recesso da
minha soledade, ouvia eu a algazarra que, rua acima, rua abaixo, faziam as
banhistas ao passarem, toalhas ao ombro, rescendendo priprioca e trevo.
Foi nesse
momento – duas horas da manhã – que uma voz infantil fez-se ouvir, por entre as
exclamações e risadas dos que passavam:
– Ta hi! Agora
eu quero ver quem é que leva a cuia de urina da mamãe!...
É que essa
“loção” também é usada como excelente antiurucubacante...
SAULO TAPAJONIO
NOTA: Texto
extraído do jornal “A Cidade” de 25 de junho de 1927.
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