Por Pe. Sidney
Augusto Canto
01. Educação
antes da chegada dos colonizadores
Os primeiros
registros sobre a educação na foz do rio Tapajós foram feitos pelos
colonizadores. Trata-se do modo como os indígenas ensinavam, de forma oral e
prática, a sua cultura: suas crenças, suas lendas, seus filhos a pescar,
cultivar o solo, produzir louças de barro, pintar cuias, e fazer os famosos artefatos
de palha que eram trocados com os colonizadores por facas, machados, anzóis e
outros utensílios até então desconhecidos por aqueles povos.
02. A educação
feita pelos missionários
Com a chegada
dos missionários jesuítas, a educação passou a ser ministrada por estes
religiosos. O foco estava, principalmente, em educar as crianças indígenas na
fé católica e também em artes de escultura e música. A educação estava à
serviço do saber religioso cristão ocidental. Quase ao final do período
Missionário, a então Missão de Nossa Senhora da Conceição ganhou o favor do rei
Dom Pedro II (de Portugal) para que nela fosse edificada um Colégio. Ele
existiu ao lado da antiga Capela, mais ou menos onde hoje está a Praça
Rodrigues dos Santos. De suas varandas, o Bispo do Pará, Dom Frei João de São
José, recolheu diversos ditados escritos em Latim, que nos chegaram até os dias
de hoje.
03. Educando na
própria casa
Depois da
expulsão dos Jesuítas, a educação era feita em casa. Os professores eram os
pais, que ensinavam a seus filhos os ensinamentos rudimentares da língua, da
escrita, da matemática. Pessoas mais abastadas, filhos dos proprietários de
fazendas de cacau, que dispunham de recursos, podiam mandar seus filhos
estudarem na Cidade do Pará (Belém) ou no Reino (Lisboa e Coimbra), onde se
formavam e, raramente, voltavam ao seu torrão natal. Nesse período, criou-se o
estranho costume de que os filhos deviam ser preparados não para irem para a
Escola, mas para cuidarem dos afazeres da produção dos sítios e fazendas da
região.
04. O primeiro
professor e a primeira escola
Somente em 1830,
a então Vila de Santarém teria o seu primeiro Professor, na pessoa do padre
santareno Raimundo José Auzier. O mesmo assumiu a educação da cadeira de Latim,
subsidiado pelo governo da Província do Pará. Logo depois foi implantada uma
Escola de Primeiras Letras, que funcionava na casa do próprio professor. Nestes
tempos, as aulas eram somente para os meninos, muitos deles filhos de
comerciantes locais e de componentes das elites políticas da Vila que não tinham
condições de manter um filho nas escolas da capital, mas que agora podiam
mantê-los na Escola da Vila. Escravos negros, indígenas, e pobres raramente
tinham acesso à escola. Com a eclosão do Movimento da Cabanagem, em 1835, a
educação, em Santarém, ficaria com suas atividades suspensas, até o final da
revolta, no ano 1840.
05. A situação da
educação pós-cabanagem
Muitos governantes
da Província do Pará reconheciam que a “falta de educação” poderia levar a uma
situação em que a “ignorância” levaria à eclosão de uma nova revolta entre o
povo. A educação dos mais pobres entrou em pauta em muitos discursos. As
escolas públicas, entretanto, estavam longe de dar aos mais pobres as condições
necessárias para que pudessem suprir as necessidades de que a cidade dispunha. Um
dos fatores era a dificuldade de o interior possuir bons professores. Para
ilustrar essa situação, transcrevemos um texto de Paulo Rodrigues dos Santos
escrito no jornal “A Cidade”, de 01 de setembro de 1923: “Em 1844, Santarém
tinha uma única escola, com 32 alunos, e Alenquer outra com 20. Ao Presidente
da Província informava a Câmara em 12 de janeiro desse ano “que a conduta civil
do professor de Santarém era boa e a do de Alenquer podia passar por isso, mas
a moral de ambos era escandalosa e repreensível””. Vale ressaltar que, naquela
época, Alenquer pertencia ao município de Santarém. Entre as mais comuns
denúncias contra os professores, além das atitudes morais supracitadas, estavam
a de abandono do emprego, a de não darem suas aulas, a de não possuírem “condições”
de ensinar por “não saberem o conteúdo”, a de maus tratos aos alunos e, infelizmente,
até mesmo a de reduzirem os alunos à condição de escravidão.
06. A contribuição
da educação nos primeiros anos de Santarém como cidade
Em 24 de outubro
de 1848, a Vila de Santarém é elevada à condição de cidade. Naquela época, e na
década seguinte, a educação muito contribuiu para os melhoramentos que a
sociedade esperava. Havia, além da Escola Elementar de Primeiras Letras, uma
Cadeira de Gramática Latina. O professor de latim, além da educação própria de
sua cadeira, também lecionava música. Santarém possuía uma banda de Música e um
Coral. Em 1851, o professor Gaspar José de Mattos Ferreira de Lucena recebia a
gratificação de 32$000 (trinta e dois mil réis) do Governo da Província para
lecionar música vocal e instrumental para os mais de 40 alunos que frequentavam
suas aulas na Escola do Município de Santarém.
07. O primeiro
Colégio e as interferências políticas
Em fins da
década de 1860, o governo da Província incentivou a criação de Colégios que, regidos
pela iniciativa privada, eram subsidiados pelo dinheiro que emanavam dos cofres
públicos. Foi assim que surgiu o Colégio Nossa Senhora da Conceição. A
princípio dirigido pelo Cônego Antônio Feliciano de Souza, depois pelo Tenente
Coronel Joaquim Rodrigues dos Santos e, por fim pelo professor Carlos Seidl. O
Colégio tinha tudo para ser um estabelecimento modelo para a educação na cidade
de Santarém. Entretanto, os conflitos políticos entre os dois partidos existentes
que dominavam o cenário político da época (Conservador e Liberal), interferiam
no bem caminhar do Colégio. As disputas políticas entre as ideologias dos dois
partidos acabavam por interferir na boa administração do Colégio. Além disso,
atrasos frequentes nos repasses das verbas públicas sempre dificultavam o bom funcionamento
do Colégio. Por fim, o mesmo veio a fechar suas portas e Santarém iria esperar
até que, a fundação do Grupo Escolar viesse a dar novos rumos para a educação
pública no município.
08. O desejo de se
construir o prédio da primeira escola pública
Poucas pessoas
talvez saibam, mas, apesar de Santarém possuir uma escola Pública desde 1830,
passariam cem anos para um prédio fosse construído para, de fato, abrigar uma
escola pública na cidade (o prédio do “Grupo Escolar”, hoje Frei Ambrósio). Antes
disso, as Escolas Públicas funcionavam nas casas dos professores ou em outros
prédios cujos aluguéis eram pagos pelo Governo Estadual ou Municipal. Entretanto,
em 15 de março de 1871, quando de sua passagem por Santarém, o dr. Joaquim
Pires Machado Portela, sugeriu que se desse início à construção de um prédio
que pudesse abrigar as aulas de instrução primária de ambos os sexos. Saindo
para Óbidos, o juiz de direito da Comarca, dr. Abel Graça, abraçou a causa e saiu
a fazer uma subscrição arrecadando a quantia de 7:000$000 (sete contos de réis)
em apenas um dia. Quando o dr. Joaquim Portela desembarcou em Santarém,
retornando de Óbidos, no dia 20 do mesmo mês. Foi acolhido festivamente pela
banda de música local e demais autoridades e foi conduzido até a Praça da
Imperatriz (atual Praça Rodrigues dos Santos) onde, às 9 horas da manhã desse
dia, assentava a pedra fundamental do que poderia ser a tão sonhada escola do
município (curiosamente, no mesmo local onde antes funcionou o Colégio dos
Jesuítas). Infelizmente, apesar da boa vontade de alguns, novamente as tensões
políticas e disputas internas acabaram por adiar esse sonho por quase sessenta
anos.
09. As
dificuldades do final do Império
No ano de 1882 a
situação da educação no interior do município não era das melhores. Haviam, além
das escolas públicas de primeiras letras da cidade, havia as escolas
elementares de Alter do Chão, Arapixuna, Aritapera, Tapará e Arumanduba, quase
todas regidas por professores que se mostravam inábeis e com inaptidão para o
magistério. Na cidade, a Escola Elementar do sexo feminino do Bairro da Aldeia
(onde moravam a maioria dos descendentes indígenas) vivia uma situação
inusitada: desde 1878 estava deslocada do bairro onde devia funcionar. Sua professora
provisória, d. Felismina da Cunha Gomes, havia removido a Escola da Aldeia para
o Centro da Cidade, privando as alunas pobres da Aldeia de uma escola mais
próxima. A professora fazia a Escola funcionar nos fundos da casa de seu pai, no
mesmo local onde também funcionava uma taberna, donde a Escola era um apêndice,
devendo as alunas entrarem para a aula acessando a taberna e sob olhar dos seus
frequentadores.
10. O papel da
Igreja na Educação
Apesar de já
termos citado que o primeiro professor público de Santarém tenha sido um padre,
bem como o fundador do primeiro Colégio, não podemos terminar este decálogo sem
destacar a importância que teve a Igreja Católica, principalmente após a
criação da Prelazia de Santarém. Um prelado tem destaque: Dom Amando Bahlmann.
Entre suas prioridades, além da fé católica, estavam a Educação e a Saúde do
povo santareno. Marco de sua gestão foi a criação de diversas escolas. Para
ilustrar, em 1918, foram fundadas a Escola São Francisco (21 de janeiro) com
matrícula inicial de 52 alunos pobres; uma outra Escola foi fundada na Prainha
(agosto de 1917) que, em 1918 tinha matriculadas 50 crianças, além de outra Escola
na Aldeia e da Escola Santa Isabel (que, além de letras também ensinava corte,
costura e culinária para meninas). Em 1919, as escolas dirigidas pela Igreja
Católica tiveram as seguintes matrículas: Santa Clara, 9 no internato, 43 no
externato e 54 no orfanato; São Francisco, 57; São José (planalto), 78; São
Raimundo (Aldeia) 82; Santa Isabel, 65 e Menino Jesus (Prainha) com 50 crianças
matriculadas. Para todo esse trabalho, Dom Amando muito contou com a
colaboração das Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição, fundada
pelo Bispo para auxiliar nos trabalhos da sua Prelazia. É desta congregação o
prédio mais antigo em que funciona uma Escola initerruptamente na cidade: o
Colégio Santa Clara, que continua no mesmo prédio desde sua construção em 1915 (vale
dizer que, a Escola Frei Ambrósio, apesar de ser o antigo “Grupo Escolar” mais
antigo que o “Santa Clara”, só ocupou o prédio atual na década de 1930). O “Santa
Clara” foi responsável, entre outras coisas, pelo primeiro “Curso Normal” que
formou diversas professoras que atuaram e dedicaram suas vidas pela educação, a
maioria delas em Escolas Públicas, da cidade e do interior. Uma colaboração,
sem dúvida, de grande valor para a formação da sociedade santarena que temos na
atualidade.
Foto ilustrativa: Colégio Santa Clara na década de 1920.
Texto construído com acervo pessoal do autor, acervo do ICBS e acervo da
Biblioteca Nacional.
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