quinta-feira, 14 de abril de 2016

Artigo: O Vale do Tapajós

Por J. Tozzi Galvão

É sem dúvida e fora de discussão que só a ferrovia Cuiabá-Santarém, como linha tronco dum bem delineado sistema ferroviário, poderá concorrer para o soerguimento dos Estados de Mato Grosso, Pará e Amazonas.
O valor técnico desta estrada despertou, em 1925, as atenções de banqueiros norte-americanos e logo um grupo se formou sob a chefia de Stanley Stony & Cia. De Nova York, com o intuito de sua imediata construção.
Nesse tempo, Henry Ford, ainda estava em princípios de negociação para a concessão do Tapajós.

Em 1929, o autor destas linhas achava-se em Nova York, a serviço do Ministério das Relações Exteriores, e nessa época fui designado para fornecer oficialmente todos os dados relativos ao Vale do Tapajós ao sr. Henry Ford, que somente após o recebimento desse meu relatório é que iniciou as suas obras no Tapajós, enviando então o seu primeiro navio, o “Lake Farge”, especialmente construído no lago Michigan para a navegação da concessão Ford, desde Nova York até Itaituba, hoje Fordlândia ou Boa Vista, e que nessa primeira viagem levou ao Tapajós um carregamento de dólares $ 2,500,000.00 (dois milhões e quinhentos mil dólares), carregamento por mim controlado em Nova York, no ato de despachar o “Lake Farge” na sua primeira viagem ao Tapajós.
A resolução de Ford, empatando vultuoso capital (cem mil contos de réis) com as obras que está realizando à margem esquerda do Tapajós é sinal seguro de ser a região privilegiada e apta para nela se desenvolver a mais intensa civilização social.
Segundo o testemunho do doutor Gonzaga de Campos, o mais autorizado mineralogista patrício, – “ser de todas as regiões estudadas, a bacia do Amazonas aquela que melhores indicações oferece para a existência de jazidas de carvão de pedra”. E mais ainda: – “No vale do Amazonas, quer nos afluentes do Norte, quer nos do Sul, é conhecida de há muito a existência do uralino, ou carbonífero superior bem caracterizado à evidencia paleontológica”. Pesquisando as suas jazidas carboníferas, diz também o dr. João Vempré, afirmou o dr. Gonzaga de Campos, que nele existem duas bacias abundantes desse minério, uma na região Tapajônica e do Madeira, e outra para o Oeste, no trecho do Solimões e seus afluentes.
Estudando a geologia nacional, sabe-se que a estratigrafia inclui a região tapajônica, pontilhando, na bacia Amazônica não só o sistema devoniano, com andares que alcançam a 60 metros de espessura, como de carbonífero, e no rio Tapajós,  apareceu estendendo-se para Oeste, atravessando a Serra do Norte, até o Rio Roosevelt (Rio da Dúvida), e para leste até o rio Xingu.
Este sistema te a sua melhor exposição em Itaituba, a 110 milhas de Santarém, onde afloram as camadas carboníferas, tanto abaixo como acima do terreno, tendo à espessura de 8 metros, a cor azulada ou pardo claro. Os fósseis aí aparecem mais ou menos silificados e muito bem conservados. Lembra o autor que, toda essa região tem a sua formação geológica das mais antigas e que nunca esteve submergida, mesmo no dilúvio universal.
Enfim, sobre este fator infalível ao soerguimento da economia mato-grossense e paraense, existem os trabalhos cientificamente honestos de Hartt, Smith, Derby, Chandlens e de Silva Coutinho.
Lembro ainda os dizeres de um grande cientista europeu – “O Vale do Amazonas será o maior celeiro do mundo, e nele poderão viver para mais de cem milhões de indivíduos, com os próprios recursos desse imenso vale de inesgotáveis recursos econômicos...”.
Quanto à Companhia, que em 1925 estava organizada em Nova York com o capital de $ 20,000,000.00 (Vinte milhões de dólares) e um crédito de $ 50,000,000.00 (cinquenta milhões de dólares), não iniciou o assentamento dos trilhos dessa ferrovia, na concessão do ilustríssimo engenheiro patrício dr. José Agostinho dos Reis, somente devido a Revolução que estalou em 05 de julho de 1925, em São Paulo, isso somente três dias após a assinatura para o início dos trabalhos, revolução que logo repercutiu desfavoravelmente em todos os círculos financeiros, é a causa de não se ter iniciado esse importante serviço Nacional.
Agora que estamos na República Nova e que é preciso nos unir num só para elevar o nosso Brasil ao grau de supremacia Americana.
Ao Governo Provisório, compete a imediata solução, isto é, a concessão de direito a um grupo de capitalistas idôneos para que o mesmo inicie no mais curto prazo possível a construção da ferrovia Cuiabá-Santarém. E assim ficará resolvido para sempre, não só as dificuldades porque estão passando atualmente os grandes Estados, Mato Grosso, Pará e Amazonas, bem como elevará a receita orçamentária da União Brasileira em muitas centenas de milhares de contos de réis.
Cuiabá, 10 de janeiro de 1932”.


NOTA: O autor é Engenheiro Geógrafo. Artigo publicado originalmente no jornal O Mato Grosso, de 31 de janeiro de 1932. Há um dado controverso no texto do autor. Os barcos da Companhia Ford chegaram ao Brasil em 1928, atracando em Santarém no dia 16 de setembro daquele ano e subindo o rio Tapajós em dezembro de 1928, e não em 1929 como se refere o autor do artigo. Outro dado a ser corrigido é que as obras de Fordlândia se encontram na margem direita do rio Tapajós (e não à esquerda, como se refere o autor, no texto).

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