terça-feira, 8 de março de 2016

Sobre um roubo de borracha da Missão do Bacabal, em Itaituba – 1883


Na vila de Itaituba (Alto Tapajós), um agente de polícia local praticou um grande roubo!
Foi seu autor um tal Américo de Oliveira Lima, subdelegado suplente, auxiliado pelo comandante do destacamento alferes de polícia, José Cordeiro do Amaral, e o roubo consistiu em uma partida de borracha, que produziu cerca de dezoito contos de réis, mandada pelo capuchinho frei Pelino de Castro Valva aos seus correspondentes.

Levado o fato delituoso aos tribunais, depois de averiguado por ordem do então presidente da província, Dr. Manoel Pinto de Souza Dantas Filho, que ordenou ao promotor público a instauração do processo criminal, foi o réu Américo de Oliveira Lima, pronunciado como incurso na penalidade do art. 269 do código criminal.
Intimado o réu da pronúncia, resistiu à prisão e, auxiliado pela polícia de Itaituba, de Aveiro, de Alter do Chão, de Santarém e de Monte Alegre, foi refugiar-se na capital, onde passou seguramente dois anos, vivendo e passeando francamente pelas ruas, pagodeando nos hotéis, constituindo procuradores para fazerem cobranças de dívidas e negociando em plena liberdade.
Conhecido o lugar onde se homiziara o réu, deprecou a autoridade judiciária ao dr. Chefe de Polícia a prisão, que nunca se efetuou, porque o criminoso convivia na mesma roda que o Chefe de Polícia frequentava.
Aborrecido dessa peregrinação o réu Américo de Oliveira Lima, veio apresentar-se em Santarém, ao juiz da culpa, em 07 de junho deste ano, vésperas da reunião do jury, deixando o seu processo de ser logo julgado por falta de preparo.
Depois, porém, que outro jury foi convocado para o dia 11 de setembro, lembrou-se o réu Américo de, nesse interregno, passear de novo pelas ruas da capital, e para isso solicitou e obteve licença do presidente da província, sr. Visconde de Maracajú que, cega e inconscientemente, está entregue aos manejos torpes da politicagem do seu secretário, dr. Theotonio R. de Brito, que é de fato o presidente da província.
Feita a concessão, negou-se ao cumprimento dela o juiz municipal, à ordem de quem está o preso, e é o competente para conceder ou não a remoção de um termo para outro, solicitando do presidente da província os meios de transporte.
Os bons e jurídicos fundamentos, pelos quais a autoridade judiciária procurou manter a sua autonomia, foram pelo presidente, Visconde de Maracajú, considerados como desrespeitosos à sua ordem, louvando o procedimento de um subdelegado de polícia, instrumento da política do secretário do governo, que com inaudita audácia, tirou o preso da cadeia e o levou para bordo do vapor, onde o respectivo comandante deixou de o receber por falta da requisição da autoridade competente!
Não podendo o sr. Visconde de Maracajú conter o seu despeito, vendo a sua ordem arbitrária e abusiva não cumprida pelo juiz municipal, imediatamente fez seguir para esta cidade o dr. Chefe de Polícia, acompanhado de 10 praças e um oficial – para tirar da cadeia o preso de justiça Américo de Oliveira Lima, pronunciado em crime inafiançável e que aguarda o seu julgamento perante o jury!
Não é um romance que estamos delineando, é a verdade constante de documentos, obtidos por certidão”.


NOTA: Publicado originalmente no jornal Brazil de 22 de setembro de 1883.

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