sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Em defesa do pároco de Santarém – 1855



Durante a epidemia colérica no ano de 1855, o Vigário Geral do Baixo Amazonas, Cônego Raimundo Antônio Fernandes, foi alvo de perseguição pública em Santarém. A acusação era de que o referido Cônego estaria cobrando dinheiro por casamentos realizados “em perigo de morte”. Em sua defesa saíram seu irmão, o Pe. João Antônio Fernandes e o pároco coadjutor, o padre santareno Raimundo José Auzier, conforme se pode ver pelos ofícios publicados abaixo:

Ofício 1
Ilmo. e Revmo. Sr.
Cumprindo a exigência de V. Sa. em seu ofício desta data passo a responder aos quesitos propostos.
No dia 20 de junho do corrente ano manifestou-se nesta cidade a invasão da epidemia, e nesse mesmo dia de noite deu V. Sa. princípio às preces públicas da Igreja, que continuaram no tríduo e se encerraram com a procissão de penitência, antes da qual, subindo V Sª. ao púlpito pregou ao povo a necessidade de implorar a Misericórdia do Senhor.
Findas as preces, soube no dia seguinte que V. Sa. enfermara do mal reinante: fui visitá-lo, e o achei prostrado com sinais visíveis do seu estado mórbido. A doença era pois real. Decorridos poucos dias, fui por V Sa. chamado para o confessar, e no dia imediato também eu fui tocado do mal, posto que ligeiramente, ficando só em pé de serviço o Revdo. Coadjutor João Antônio Fernandes, que felizmente se viu preservado pela Providência para acudir às necessidades do rebanho.
E ele ordenou V. Sa. continuasse novas preces e mais exercícios de piedade com o povo reunido na Matriz, o que cumpriu; e eu que já então me achava reestabelecido o ajudei nas preces, acompanhando a procissão do último dia.
Consta-me que V. Sa. mandará por a disposição do mesmo padre o seu carrinho pronto e aparelhado, para mais facilmente acudir aos enfermos com os socorros da Igreja.
Finalmente nunca em tempo algum, máxime na horrível época, de que apenas respiramos, observei que V Sa. exigisse a mínima pitança por casamentos feitos in extremis.
É o quanto posso e devo declarar em abandono da verdade, e o jurarei, sendo necessário.
Deus guarde a V. Sa. Santarém 23 de agosto de 1855.
(Ao) Ilmo. e Revmo. Sr. Raimundo Antônio Fernandes, Vigário Geral do Baixo Amazonas.
Raimundo José Auzier, Coadjutor da Freguesia”.

Ofício 2
Ilmo. e Revmo. Sr.
Acuso a recepção do oficio de V. Sa. de ontem em que exige a resposta dos quesitos constantes do mesmo, os quais respondo pela maneira seguinte.
Resp. 1º. É inegável, que se fizeram preces públicas nesta Freguesia, logo que apareçeu a epidemia e que foi V. Sa. quem fez, assim como no último dia do tríduo antes da Procissão orou V. Sa. fazendo ver a necessidade da penitência.
Resp. 2ª. Sei que foi V. Sa. atacado do cólera e que esteve bastantemente em perigo, isto presenciei as repetidas vezes, que fui a sua casa.
Resp. 3ª. Não padece a menor dúvida, que como Coadjutor me recomendou V. Sa. que fizesse novas preces, assim mais outros exercícios de piedade, o que foi por mim pontualmente observado.
Resp. 4ª. É público, e notório, que o carro em que andei foi de V. Sa. que liberalmente pôs à minha disposição, para com mais facilidade acudir de pronto aos enfermos afetados da epidemia.
Resp. 5ª. Não me consta que V. Sa. mandasse pedir dinheiro por casamentos in art. mortis, fui eu quem os fiz, e desafio a população desta Cidade, para que diga o contrário de que afirmo.
Deus guarde a V. Sa. Santarém, 3 de agosto de 1855.
(Ao) Ilmo. e Revmo. Sr. Raimundo Antônio Fernandes, Vigário Geral da Comarca.

O Padre João Antônio Fernandes”.

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